As eleições do passado domingo demonstraram, mais uma vez, que em Portugal há uma maioria absoluta e significativa de pessoas que votam à esquerda. Apesar disso, o Partido Socialista (PS) não conseguiu sozinho a sua maioria absoluta. No meu entender, o PS deve queixar-se apenas de si próprio. Se o trabalho meritório de consolidação das contas públicas tivesse sido feito à custa de um combate sério e estruturado à corrupção ou através de cortes drásticos na injeção de capitais públicos no sistema bancário/financeiro, para proteger os privilégios de bancos e de banqueiros, talvez o PS tivesse chegado à sua maioria absoluta. No entanto, como sabemos, as opções de Centeno foram outras. Centeno optou por acertar as contas públicas à custa de dois serviços públicos (Educação e Saúde). A não devolução dos devidos rendimentos aos professores e as cativações no orçamento do Serviço Nacional de Saúde (SNS) são apenas os dois exemplos mais conhecidos. Mas tudo isto é já passado.
Falemos do futuro. Em resultado dessas eleições teremos nova Assembleia da República e novo Governo, renovando-se a esperança de que a entrada em cena de novos protagonistas traga consigo algumas alterações, que muitos, tal como eu, esperam que sejam no sentido de corrigir os erros do passado recente. Quanto à Educação, nomeadamente no que à Escola Pública diz respeito, há dois problemas que deveriam merecer a atenção do novo Parlamento e do novo Governo. Os últimos estudos patrocinados pela União Europeia na área da Educação demonstram que é necessário rejuvenescer a nossa classe docente, que é das mais envelhecidas da Europa, e que é necessário também atualizar os salários dos docentes, até porque, segundo o relatório “Eurydice – 2017/2018 – Facts and Figures”, os professores portugueses são aqueles que, na Europa, começam a trabalhar com salários mais baixos e aqueles que mais tempo demoram a chegar ao topo da carreira. O rejuvenescimento da classe docente e a devida atualização salarial são dois instrumentos imprescindíveis e estruturantes para introduzir no sistema educativo as doses de justiça e de motivação necessárias para que o nosso ensino público dê o próximo salto qualitativo, para bem da população portuguesa e do desenvolvimento do país.
A solução para estes dois problemas pode surgir de uma só medida. A devolução aos professores do tempo de serviço que está ainda “cativado” no Ministério das Finanças, cerca de seis anos, resolveria as duas questões. Isto é, a devolução imediata dos seis anos de tempo de serviço que efetivamente cumprimos nas escolas poderia ser utilizado para permitir a aposentação antecipada de todos os docentes com sessenta anos ou mais, para além de permitir a justíssima atualização salarial aos docentes dos quadros. Em termos puramente financeiros ou orçamentais, esta solução tem também potencialidades interessantes. A troca de milhares de professores do topo da carreira, que passariam para a aposentação, por outros mais novos, representaria uma poupança de alguns milhões de euros no orçamento anual do Ministério da Educação. Embora houvesse o correspondente aumento de encargos para a Segurança Social, como é evidente.
Para além disso, está em cima da mesa uma proposta ainda mais interessante, pelo menos do ponto de vista orçamental: a proposta de devolver esses seis anos de serviço a todos os professores, não agora, mas apenas aos sessentas anos. Isso significaria que os custos associados a esta devolução seriam diluídos ao longo dos próximos vinte anos. O que se traduziria em impactos orçamentais anuais absolutamente insignificantes. A contra-indicação desta última solução é apenas uma: os docentes não receberiam todos os seis anos ao mesmo tempo, uma vez que alguns só iriam recebê-los daqui a dez, quinze ou vinte anos. Embora tivesse a virtualidade de retirar do sistema, durante duas décadas, professores com mais de sessenta anos.
Com uma fórmula ou com a outra, com a devolução imediata ou com a devolução aos sessentas anos, espero que o novo Parlamento e o novo Governo passem da retórica às medidas concretas e que tomem as decisões que salvaguardem os interesses da Escola Pública portuguesa, implementando as reformas necessárias, no respeito pela carreira docente em vigor e pela necessidade de remotivar e rejuvesnescer a classe docente.
Os processos de mudança não se devem fazer contra as pessoas, mas com as pessoas. Pensar o contrário é uma ilusão, que, mais cedo ou mais tarde, se irá revelar sempre amarga… como se tem visto nas mais diversas áreas e latitudes.