As festas e romarias que nesta altura do ano, em condições ditas de normalidade, se multiplicariam um pouco por todo lado, possuem uma importância vital no processo de reforço da identidade das comunidades onde se realizam.
Como se teve oportunidade de ver sublinhado aquando do período de confinamento, é essencial ao ser humano, a existência de narrativa, a existência de ritual que recentre os indivíduos com o ambiente onde se inserem. Sem narrativas, não existem conclusões e sem conclusões o sentimento de perda como dor aumenta.
Os rituais inerentes às romarias e festas populares trazem consigo uma certa representação daquilo que é o sentir da comunidade. O ritual retira a pressa, impõe o seu tempo, o tempo da narrativa que tem um fim, aquele que dá sentido ao corpo comunitário. Como dispôs Sartre, o corpo torna-se obsceno quando é reduzido à mera faticidade da carne. Obsceno é o corpo sem referência, que não está em ação ou em situação.
Torna-se claro que as festas populares e romarias, não devem ser desvirtuadas deste seu papel e converter-se em meros eventos turísticos ou, ainda pior, incorporar elementos de mera exposição em substituição da narração. Ao contrário do elemento da comunidade, que procura o fim, a sua integração na sua comunidade quer em termos presentes quer em termos de futuro, ao turista só lhe interessa o aqui e agora, a fotografia, o mostrar que esteve ali, a transparência …
É verdade que tudo evolui, contudo desenvolvimento não é o mesmo que progresso. Nesta vertente o progresso tem muito mais a ver com a conservação dos rituais, com acentuação da inclusão de todos os elementos da comunidade compatibilizando essa inclusão com a liberdade individual de cada um de se querer integrar nesses processos.
Os organizadores deste tipo de eventos tão importantes ao invés de cair na tentação desta ou daquela moda de exposição, destes ou daqueles laivos não fundamentados de captação de “gente de fora”, devem focar-se nas “suas gentes”, naquilo que os rituais, que inclusive incluem dinâmicas socioeconómicas, podem trazer de benefício à sua forma de viver. Isto sem esquecer, que nada deve ser imposto, os que, por qualquer razão, não queiram participar devem ser tão respeitados como os que querem, tornando-se muito importante o equilíbrio da aceitação negociada. É isto que é progresso e não o aumentar o som, o fogo-de-artifício ou qualquer coisa do género.
Concluindo, as festas e romarias vão muito mais além da diversão e das oportunidades económicas que proporcionam, itens muito importantes mas que ficam aquém quando comparados com o alimento que trazem ao espírito de cada ser humano na sua integração comunitária tão essencial para o equilíbrio que inclui com certeza todo o ambiente que nos rodeia.
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