“O meu bigode tem tantos dias e anos como o 25 de abril”
António de Sousa Ribeiro Pacheco, natural da freguesia de Pias, emprega a sua memória célere e, num ápice, as lembranças de outrora. Há sempre uma história sobre a Revolução de 25 de Abril de 1974 e que o diga o lousadense que viveu todos os acontecimentos de perto, com incerteza e esperança. Com 70 anos de idade, foi membro e fundador de diversas associações e Presidente da Junta de Freguesia de Boim e demais cargos por inerência da sua função política. Ao longo da entrevista, explana com nostalgia a história da sua vida.
Nasceu no dia 16 de março de 1952 em Pias, nos dias de hoje, habita na freguesia portuguesa do concelho de Lousada, Silvares. Ainda nem um mês de nascença tinha quando foi batizado na Igreja Matriz de Pias, a 6 de abril do mesmo ano.
No ano de 1958 ingressou na Escola Primária de Boim até à 4º classe. Após terminar o primeiro ciclo, foi estudar para o Colégio Eça de Queirós e neste concluiu o 5º ano do curso geral dos liceus, apelidado de então 9º ano de escolaridade.
Finalizou a sua vida académica no ano de 1970 e, entretanto, começou a estagiar na FAMO onde foi admitido na mesma no dia 1 de novembro de 1971. O seu percurso nesta entidade terminou em 1987, com 16 anos de atividade.
Neste ano, trabalhou de março a agosto na Translousada e, no dia 1 de setembro, entrou na Sioux Portuguesa, onde permaneceu 25 anos ao serviço desta. Durante este período, de 2000 a 2012, exerceu a atividade de Técnico Oficial de Contas. Em 2012 encerrou este capítulo da sua vida e passado três anos, em 2015, reformou-se com 45 anos de serviço e 63 anos de idade.
“A minha infância não foi muito fácil pois nessa data a vida não era nada do que hoje se assiste”, afirma quando interpelado sobre os seus primeiros tempos de vida. António viveu com os seus pais na habitação dos seus avós maternos. De acordo com o próprio, comeu sempre bem e só havia necessidade de comprar os produtos de mercearia e peixe porque os restantes alimentos eram obtidos em casa.
Recorda que nunca foi descalço para a escola como, infelizmente, alguns colegas do seu tempo. Quando ingressou no Colégio Eça de Queirós apenas foi com mais quatro indivíduos, uma vez que os restantes foram trabalhar para ajudar os progenitores no sustento da família.

António casou com a mulher da sua vida em dezembro de 1976 na qual resultaram três filhos e, por conseguinte, dois netos. O orgulho e alegria são sentimentos constantes representados no rosto e nas palavras sempre que aborda o seu núcleo familiar.
Agora, vamos escutar o 25 de abril vivido na primeira pessoa, por António Pacheco. O lousadense fala da Revolução com emoção e sem palavras para exprimir a satisfação que significou para si, e para muitos, este acontecimento que mudou a vida de todos em Portugal.
No dia 22 de janeiro de 1973 ingressou no serviço militar obrigatório no Regimento de Infantaria nº5, nas Caldas da Rainha, para realizar o curso de sargentos milicianos. Enquanto executava o mesmo, foi chamado para prestar provas para o curso de oficiais milicianos. “No dia em que prestei provas fiquei logo a saber que tinha sido aprovado pela forma como fui elogiado pelo Capitão que me observou”, sublinha.
No mesmo ano, foi para a Escola Prática de Infantaria, em Mafra, com o intuito de tirar a respetiva especialidade. Esta terminou a 20 de julho com a imposição dos galões de Aspirante a Oficial Miliciano.
A 31 de julho de 1973 foi colocado no CICA 5 – Centro de Instrução e Condução Auto nº5, em Lagos. E, a partir de então, começa a sua passagem nesta unidade que vivenciou de forma chegada o 25 de abril de 1974. De referir que a seguir ao 3º Juramento de Bandeira dos recrutas da unidade, o responsável pelo Conselho Administrativo, convidou-o para exercer as funções de tesoureiro.
Corria o ano de 1974 quando no dia do seu aniversário, a 16 de março, pelas 4h00m da madrugada recebeu uma chamada telefónica a comunicar que o CICA 5, na qual estava instalado, tinha de entrar em prevenção devido ao “Movimento das Caldas”.
Este dia foi especialmente marcado pelo acontecimento referido e, com dose extra, por ser a celebração de mais um ano de vida. Na época, António usava bigode, figura característica, porém, a mando de um comandante foi obrigado a retirá-lo para tirar a fotografia para a obtenção do Bilhete de Identidade Militar.

No dia 23 de abril de 1974, um aspirante que tinha chegado à unidade para cumprir castigo pela participação no evento de março, foi chamado para ir para o Centro de Retransmissões da RTP, na Foia. Neste mesmo dia, pelas 23h00m da noite, todos os Oficiais e Sargentos Milicianos foram convocados para se apresentarem no quartel para receber armas e equipamentos.
De imediato, souberam que estava a haver o Movimento dos Capitães, em oposição ao regime e à Guerra Colonial Portuguesa. Esta informação foi transmitida pelo 2º comandante que, prontamente, pretendeu saber de que lado cada militar se encontrava. A partir de então, foi acionada a telefonia onde puderam escutar a senha “Depois do Adeus” e, posteriormente, a “Grândola, Vila Morena”, composta e cantada por José Afonso. Esta última avisou que o Movimento das Forças Armadas estava na Rua. Perante estes factos, os Milicianos deram o incondicional apoio ao M.F.A.

De madrugada deixou de se ouvir e de manhã as comunicações foram restabelecidas. A unidade CICA 5, onde António estava, foi a única unidade do comando territorial do Algarve que aderiu ao Movimento dos Capitães. Após a rendição de Marcello Caetano, “o objetivo imediato era Democratizar, Descolonizar e Desenvolver Portugal”, salienta.
Desde então, António voltou a deixar crescer o seu bigode que outrora tinha sido obrigado a rapá-lo. Hoje em dia ainda o mantém, afirmando, “o meu bigode tem tantos dias e anos como o 25 de abril”. No dia 27 de abril, comandando um grupo de soldados, o lousadense foi prender a PIDE a Portimão.
A sua carreira militar terminou no dia 12 de fevereiro de 1975 por baixa de serviços devido à sua incapacidade física. O lousadense foi vítima de um acidente de viação bastante grave, a 4 de outubro de 1974, no qual foi internado no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra e operado no dia 6 de outubro, célebre Dia Nacional do Trabalho.
Após esta pausa definitiva, iniciou uma carreira política. “A minha atividade política iniciou-se logo em 1975 e 1976 nas campanhas eleitorais das eleições para a Assembleia Constituinte e para as Autarquias no apoio à Comissão Política do Partido Socialista”, principia.
No ano de 1979, decidiu candidatar-se à Assembleia de Freguesia de Boim como cabeça de lista. Tudo correu no sentido desejado e foi eleito por maioria absoluta, tornando-se Presidente da Junta de Freguesia de Boim durante 10 anos.
“A minha primeira preocupação foi tratar de criar acessibilidades e melhores condições para toda a população”, salienta, visivelmente satisfeito e realizado pelo trabalho realizado durante o seu mandato.
Em 1989, por opção própria, decidiu não se candidatar mais. Esta certeza fez com que António recebesse vários apelos e súplicas para, pelo menos, concorrer a mais um mandato. Contudo, rejeitou devido ao desgaste. “Não abandonei de todo porque candidatei-me à Assembleia Municipal encabeçada pelo saudoso Dr. Mário Fonseca, e, após a tomada de posse fui eleito para a Mesa da Assembleia Municipal como 1º secretário, função que exerci até 2006, ou seja, durante 16 anos”, conta.
António fez parte dos órgãos sociais da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Lousada de 1978 a 1985. Dos trabalhos realizados em prol desta associação destaca os peditórios realizados em 1978 e 1979 para as obras de remodelação e ampliação do quartel cuja inauguração deu-se em 1980.
Relativamente à Associação Desportiva de Lousada desempenhou de 1989 a 2007 diferentes cargos. Além dos mais, esteve na Associação de Cultura Musical, na União Cultural e Recreativa de Boim e no LAC – Lousada Académico Clube. Nesta última associação, colaborou com o Sr. Eurico Melo nas modalidades de Judo e Hóquei em Patins, bem como foi fundador do Basquetebol em 1997.
Foi membro do Conselho de Administração de Lousada Século XXI de 1 de março de 2002 até 31 de agosto de 2012. Como mencionado no início, aposentou-se em dezembro de 2015 por antecipação da reforma com 45 anos de descontos.
Em jeito de conclusão, refere que sente grande orgulho em pertencer à vila de Lousada. “O nosso concelho possui obras e infraestruturas emblemáticas que permitem uma grande qualidade de vida”, finda.

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