Canto do Saber – A opinião de Eduardo Silva
Estão já aí as eleições presidenciais. Apesar de todos os constrangimentos impostos pela pandemia, o imperativo é votar, aliás, como sempre. É um ato de cidadania em que todos nós temos a possibilidade de mostrar a nossa posição com a escolha daquele que, achamos, melhor nos representa dentre os que candidatam.
É aqui, em escolher entre os que candidatam, aquele que melhor nos representa, que reside a questão. O cansaço e até, porque não, alguma falta de eros, relativamente aos candidatos das áreas políticas mais tradicionais, gera, em muitos, a tendência algo ingénua de optar por este ou aquele que eventualmente quer fazer crer que não se enquadra no sistema.
Trata-se do já conhecido voto de protesto, algo como sendo a voz do povo a castigar o político de todos os dias, ou seja, as pessoas em vez de desenvolverem atividade cívica durante os mandatos dos políticos e exigirem uma atuação dentro do seu quadro de expectativas, simplesmente decidem castigar com um voto em algo que no fundo até nem acreditam, até porque está a votar em quem nunca, presumivelmente, chegará ao poder.
Claro está, que existem aqueles que dizem votar desta maneira, porque não se reveem em nenhum candidato e, portanto, decidem fazer uma espécie de experimentação. No entanto, deve-se ter em conta que as opções em urna, devem revestir-se de gravidade ao invés de ligeireza. Está-se a decidir o destino de uma nação, por um período que pode nem sequer restringir-se ao prazo do mandato para que se está a votar.
Obviamente que não se vota em quem nos representa, mas sim em alguém que se candidata para nos representar. A ideia é a de verificarmos nas propostas de cada candidato aquelas que mais se aproximam daquilo que perspetivamos para a ação do órgão em causa.
Esta verificação exige que se abandone a conversa de café e que se pare um pouco para fazermos o exercício de percebermos em qual dos candidatos, de alguma forma, ainda que pequena, melhor nos revemos. O exercício em causa não deve ater-se apenas aos discursos panfletários, que apenas acabam por passar um atestado de menoridade a todos nós.
Uma admissão de que o povo só lê os títulos e nunca o texto que lhe segue. Os títulos que estimulam apenas a emoção. Não! Embora a emoção não esteja de maneira alguma afastada da política, temos que nos munir da racionalidade, ler o que está por baixo do título, se é que alguma coisa lá está escrita, ou pelo menos, se possui algum substrato, alguma fundamentação que se enquadre com os nossos anseios. Observar e refletir é vital.
Claramente, mais do que noutras, as eleições presidenciais trazem o tipo de candidato ideal para o tal voto de protesto, invulgarmente o antissistema. O candidato que, ou assume a forma do palhaço empático, sem conteúdo que não seja um certo romantismo hollywoodesco de que pelo fato de ser igual se poderá exercer funções para as quais não se está preparado; ou aquela imagem de denunciador de um sistema corrompido, que está podre, numa espécie de messianismo que através de parangonas entolda o juízo às pessoas, podendo fazer com que o sangue suba à cabeça e que daí não saia. A emoção é posta ao rubro, a ebulição excrementa o básico que há no animal humano. Mas o ser humano pensa, ação de que nunca se deve demitir.
Por isso, insisto, há que parar para meditar, olhar para os candidatos começando por aqueles que se enquadram naquilo que eu acima descrevi como o de tipo ideal para voto de protesto e dizer para nós: “É com este tipo, que de algum modo me identifico? É este tipo que eu quero para representar o meu País, o meu povo?”.
A Democracia é igualdade, não é o mesmo que liberdade. Se a igualdade permite que qualquer um de nós, sob as condições consignadas na constituição possa candidatar-se, a liberdade, aquela que é institucional, obriga a uma responsabilidade acrescida que tem que ir muito além de nos guardarmos para protestar com o voto, sob pena de tornar aquilo que não passa de dejeto da democracia num pesadelo. O que constitui este dejeto deve ser eliminado da cena política, qual estrume que possa favorecer o aparecimento de candidatos com propostas profundas de exequibilidade institucional.
O nosso papel é o de agir nas duas vertentes, castigar os que se apresentam para capitalizar à custa do nosso cansaço e o de promover o aparecimento daqueles que possam fazer da ação política uma ação de conteúdo pluralista que vá de encontro a uma sociedade que se considera, a si própria, cada vez mais, apolítica.












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