E DEPOIS D’ABRIL? [9]
Após a revolução de 1974 surgiu no léxico português uma panóplia de rótulos, epítetos e adjetivos, nem sempre abonatórios, que serviam para identificar e/ou ridicularizar os membros ou simpatizantes de cada partido. Quem está familiarizado com esta temática depressa chega aos nomes atribuídos aos seguidores do CDS ou aos militantes do PPM, por exemplo. De uma forma geral, os visados não gostavam dessa nomenclatura, que surgia carregada de provocação. A grande exceção acontecia com os seguidores do Partido Comunista, que ainda hoje não enjeitam a designação “comunas”.
Embora em acentuado declínio no espectro eleitoral português atual, o PCP viveu fases de grande preponderância e vitalidade, antes e depois do 25 de Abril. No tempo da ditadura foi uma força temida pelo regime. Verdade seja dita e honra seja prestada, que aos comunistas se deve o principal quinhão da oposição a António de Oliveira Salazar. Foram uma espécie de infantaria que desbravou terreno para o triunfo da democracia.
Nos tempos que correm, numa correria quase frenética, puxada pelos watts e decibéis do capitalismo, os princípios marxistas vão perdendo focos e palcos, microfones e tempos de antena, mas sobretudo seguidores crentes no ideário comunista.
Mas, ainda há “comunas”, militantes e simpatizantes combativos (como sempre), fiéis (como poucos) e orgulhosos (como só eles). “Sou comuna”, é algo que se ouve alto e bom som de um deles. O mesmo não acontece tão facilmente com um “facho”, um “xuxa” ou um “laranja”.
Os comunistas orgulham-se sobretudo do peso histórico do partido, que lutou afincadamente, com sangue, suor e lágrimas contra a ditadura. Mas a radicalidade no pós-25 de Abril não beneficiou o comunismo, que extremou a sua posição em diversas matérias, num país de brandos costumes e num Ocidente cada vez mais americanizado. Muita da força resistente que galvanizou o partido até ao século XXI deveu-se ao carismático Álvaro Cunhal.
Em Lousada, as raízes comunistas remontam a meados do século XX. O primeiro de todos terá sido o lousadense Manuel Pires Teixeira da Mota, que foi militante do antiquíssimo Partido Socialista Português, de ideologia marxista. Outro preponderante comunista local foi Antero Alves Moreira, que exercia profissão de guarda-livros, foi identificado nos relatórios de vigilância da PIDE como pertencente a uma Comissão Executiva do Movimento de Unidade Democrática, salientando aquela polícia política que: “Desconfia-se de que este indivíduo pertence à organização secreta chamada Partido Comunista. Já esteve, segundo parece, preso na PVDE” (PIDE-DGS, 1946-1971). Também pertenceu ao Socorro Vermelho, uma organização marxista ainda mais radical que o PCP. Igualmente dos mais antigos e mais carismáticos, foi Arnaldo Mesquita, advogado da Aparecida, que teve o condão de ser o primeiro comunista na Assembleia Municipal de Lousada, eleito pela coligação FEPU – Frente Eleitoral Povo Unido, em 1976. Como deputado municipal destacou-se profusamente com intervenções inflamadas pelos seus acérrimos ideais comunistas, fazendo jus ao seu dom de eloquente tribuno.
Da mesma geração, o engenheiro Joaquim Gaspar Guimarães, da casa do Rio (Torno), foi o primeiro candidato do PCP à Câmara de Lousada, em 1976. A linha da frente do partido no pós-25 de Abril era formada por intelectuais, onde se encontravam algumas mulheres, como as professoras Maria Júlia Guimarães e Maria Armanda Monteiro.
Esse núcleo liderava a difusão do partido e urdiam as diretrizes que uma vasta legião de militantes fazia por aplicar no terreno. Eram os operacionais. Mas nem por isso deixavam de ser menos interventivos e protagonistas. Falamos por exemplo de Francisco Cunha da Rocha, de Meinedo, e sua esposa Margarida Peixoto, dos Eidos Novos (Pias). Estes recordam que “o PCP não teve vida fácil em Lousada, onde fomos muito perseguidos”. Mas sempre firmes, mantiveram-se nas hostes comunistas. Estes octagenários, verdadeiras figuras vivas da luta democrática lousadense, lembram “o episódio do Centro Paroquial de Meinedo, onde uma sessão de esclarecimento do MDP, onde estavam sobretudo comunistas, foi muito mal recebida pelo padre da época”.
Parece que na altura circulou a ideia de que o PCP queria ocupar definitivamente o salão. Gerou-se “uma grande confusão, ficamos todos fechados lá dentro, aquilo esteve muito perigoso”, mas a chegada de forças militares de Penafiel e do Porto resolveram a contenda.
Meinedo acabaria por ser um importante bastião comunista em Lousada. A isso não foi alheio o facto de ser uma localidade com muitos ferroviários, profissão bastante sindicalizada e como tal muito politizada pela central sindical de cariz marxista que dominava o setor ferroviário. Além do referido Francisco Cunha da Rocha, outros profissionais dos caminhos de ferro devotaram o seu ativismo ao PCP, como Augusto Machado Silva. Por último, mas não menos importante, uma referência a outro apaniguado destas lides após o 25 de Abril, que muito contribuiu para a planificação e sobretudo difusão das atividades comunistas: o tipógrafo e editor Manuel Afonso da Silva, mais conhecido por Manuel «Rei».














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