Ser entalhador é uma profissão em extinção. Manuel Pinto, de 57 anos, tenta contrariar o destino de uma arte que, durante décadas, foi o ganha-pão de muitas famílias.
O artesão recebeu-nos no dia do seu aniversário, 3 de agosto, na sua oficina em Macieira, onde reside e de onde é natural. Antes de entrarmos, mostrou-nos algumas peças da sua autoria. Umas destinam-se à venda, outras são verdadeiras peças de arte de museu.
Apesar de todos os irmãos serem alfaiates, Manuel começou por aprender a arte de entalhador muito cedo, com apenas 14 anos, por influência de um cunhado, que trabalhava no ramo. “Comecei em Rebordosa, com o meu cunhado, numa oficina pequena com sete ou oito empregados. Depois trabalhei em Lordelo numa fábrica de móveis. Entretanto, a firma fechou e comecei a trabalhar por conta própria. Assim estive muitos anos e tive funcionários”, conta.
Durante décadas fez da arte de entalhador a sua profissão e não tinha mãos a medir para satisfazer os pedidos do cliente. Mas as mudanças nas linhas de mobiliário foram um duro revés na profissão e viu-se obrigado a relegar para os tempos livres a arte de que tanto gosta. Atualmente trabalha na indústria de calçado, já que as encomendas não lhe permitiam continuar a viver da antiga profissão.
Agora, a sua oficina é lugar de trabalho essencialmente aos fins de semana. É aí que transforma pedaços de madeira em verdadeiras obras de arte. Quadros, imagens religiosas, símbolos clubísticos, brasões… São algumas das obras que podemos ver na sua oficina, algumas ainda em fase de acabamento.
Para nos dar um cheirinho do que é o seu trabalho, Manuel Pinto, agarra um pedaço de madeira e deita mãos à obra. Auxiliado por algumas ferramentas, das cerca de 150 que possui, eis que rapidamente faz surgir na madeira uma linda flor, no centro daquilo que será um suporte para pendurar panos de cozinha. Um trabalho extraordinário que parece fácil, mas é o resultado de muito talento e anos de experiência.

Brasões da monarquia espanhola da sua autoria
Mas Manuel não é um simples entalhador que executa modelos já criados. Ele próprio assume o papel de criador, desenhando peças novas que, depois, executa. É o caso de um quebra-nozes que ostenta num armário de peças já prontas. Trata-se de um utensílio criado por si que, certamente, poucos conhecerão. “As pessoas ficam admiradas com a forma como eu trabalho, com as coisas que me saem da cabeça. Sou criador e também sei desenhar e isso é o principal do entalhador”, afirma.
Ao longo da sua carreira profissional, orgulha-se de ter executado trabalhos para figuras de relevo na sociedade portuguesa. Pinto da Costa, Maria Elisa, Eusébio… Teve a honra de entregar a este último o brasão do Benfica, o seu clube. Mas o rei de Espanha também foi seu cliente, ao encomendar-lhe dois brasões da monarquia espanhola.
Pequeno altar na catedral de Santiago de Compostela restaurado por Manuel Pinto
Aqueles que quiserem admirar as suas obras podem fazê-lo em vários locais públicos: brasões de câmaras municipais, de juntas de freguesia, altares… São muitos os trabalhos espalhados pelo país e pelo mundo. Como curiosidade refira-se o facto de a ele se dever o restauro de um altar na catedral de Santiago de Compostela. “Fiz o altar de São Gonçalo de Macieira e foi tudo feito de raiz, pois estava tudo podre. Restaurei também o altar da igreja de Alvarenga”, refere.
Numa vertente mais comercial, Manuel executa ainda objetos encomendados para serem vendidos ao público em diversos locais, como lojas e feiras: porta-garrafas, garrafas com mensagens no seu interior, objetos decorativos… Todos feitos com dedicação e paixão.
Dar formação na área é uma das suas ambições
Algo desencantado com o facto de não ver seguidores para esta arte, Manuel gostaria de dar formação nesta área e até já expôs a sua intenção à Câmara Municipal de Lousada: “Já pedi na Câmara Municipal para conseguirem alguma coisa, mas não fizeram nada, e acho isso uma pena, era importante apoiarem esta arte”, sustenta. Acrescenta que gostaria de ensinar a sua arte a outras pessoas: “Fiz isso em Amarante, comecei a trabalhar lá numa escola e os próprios professores ficaram admirados, pois eles tinham a teoria, mas eu tenho a prática”.
As filhas também não parecem inclinadas para este ofício: “Tenho três filhas, mas não querem seguir isto. Uma delas ainda fazia alguma coisa, mas já casou e não quer saber disto”, lamenta.
Orgulhoso da sua arte, já participou por diversas vezes em feiras de artesanato, onde não só expõe, mas executa também as suas peças, para que o público possa ter um conhecimento mais profundo do seu trabalho.
Apesar de todo o seu esforço, não tem esperança de que a arte de entalhador continue viva. Mesmo assim, Manuel continuar a lutar para a perpetuar.
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