A poesia popular (V)

A cultura do linho teve raízes na nossa Terra há muitos milhares de anos, por um lado por ter encontrado boas condições ambientais e terra fértil, e, por outro lado por ser um forte elemento da economia rural. Os lavradores usavam o linho ou os lucros da sua venda para pagarem as rendas das terras aos senhorios, e, o que sobrava as mulheres teciam-no e bordavam os panos, para poderem dar algum dote aos filhos, aquando dos seus casamentos e, também, para fazerem o vestuário que usavam nos momentos mais importantes da vida social e religiosa.
Já Camilo Castelo Branco em vários escritos e Júlio Dinis nos seus livros: “serões da Província; Fidalgos da Casa Mourisca ou Pupilas do Senhor Reitor”, faziam alusão à importância do linho nesta região como matéria prima para a feitura dos vestuários e dos adornos para as habitações, principalmente em momentos de festa e momentos de índole religiosa, bem como para “enriquecer” os altares das Igrejas e das Capelas particulares das casas senhoriais e ainda, como importância na melhoria da economia pessoal e da região.
Até se cantava:

I
Deste linho é que eu fabrico
O meu enxoval inteiro
O que tem mais valor:
É linho, ouro e dinheiro
Os trabalhos inerentes à cultura do linho eram muito cansativos e exaustivos, e duravam cerca de um ano desde a sua sementeira até à tecelagem final do pano.
Os “martírios do linho” (Ciclo do linho) com as suas variadas fases, desde a arranca, até ao fiar e posterior dobagem e tecelagem, passando pelo malhar o linho, pelo seu mergulho na água e a secagem no monte, pela ripagem, assedagem, a barrela e a lavagem, de entre outras fases, era um complexo trabalho, moroso e paciente, mas sempre ligado à Festa.
Não havia atividade relacionada com os trabalhos do linho alguma, que no final não terminasse com danças e cantares dedicados ao “ciclo do linho”. Imensos versos que bem poderiam fazer parte principal de um grandioso “Cancioneiro de Lousada”, principalmente em forma de quadras, e, que algumas delas, aquelas que achamos mais tradicionais e antigas, deixamos aqui, como uma espécie de homenagem aqueles que ainda hoje preservam e representam as fases do linho, nomeadamente os Grupos Folclóricos.
II
Lavrador vai para o campo
Semeia a linhaça querida
Dá-te muito que fazer
Mas em três dias está nascida
III
As voltas que o linho leva
Antes de entrar no tear
Não são tantas como as voltas
Que o lavrador tem de dar
IV
Tem que lhe dar quinze voltas
Trabalhando com amor
Para no fim ser usado
Até no altar do senhor.
V
Vai o linho, vai o linho
P’ra Maria tecedeira
Gosto muito da Maria
Minha linda lavradeira.
VI
Canelas chorai, chorai
Já morreu a tecedeira
Quando as canelas choram
Que fará a lançadeira?
VII
Meu amor aparta, aparta
O linho da bagarela
Eu também vou apartar
Os amores da minha terra.
VIII
Lá por sermos velhinhas
Ainda temos o nosso valor
Andamos a fiar o linho
Para o Altar do Senhor.
IX
Espadelai raparigas
Entoai vossas cantigas.
Com alma e coração
Não deixeis que arrefeça
O ardor deste serão!…
X
Com que graça pões a roca
Cachopa do meu olhar.
O linho beijas com a boca
E para mim nem um olhar!…
XI
Andam na roca a fiar
Os dedos da fiandeira
Gira o fuso sem parar
Ao serão e à lareira.
XII
Como nós (mulheres) não há!…
Nem as mais pintadas.
Como nós não há!…
Para dobar meadas.
O patrão ía todos os dias ao ribeiro ver se o linho tinha ido “água abaixo” pois as pedras que o seguravam poderiam ter-se soltado e a perca era muito grande. Quando lá chegava e via que estava tudo em ordem e para ver se estava pronto para ser levado para os montes cantava:
XII
O linho diz à água
Muito triste num lamento
Quisera ser como tu
E ter asas como o vento…
(CONTINUA)

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