António “Massas” Fernandes, um socialista histórico

No passado lousadense há pessoas sem grande escolaridade que se destacaram entre os mais ilustres. António Fernandes, o famoso “Massas”, da Senhora Aparecida foi uma dessas pessoas e provavelmente o menos letrado dos vereadores municipais da história lousadense. O seu trabalho social e político acabou recompensado com a eleição para dois mandatos de Vereador na Câmara Municipal de Lousada. É ele a pessoa escolhida por mim para representar São Pedro Fins do Torno nesta coleção intitulada Louzadenses com Alma dedicada a pessoas que se destacaram em vida em cada uma das freguesias de Lousada.Embora fosse natural de Aião (Felgueiras), onde nasceu em 20 de setembro de 1926, António Fernandes viveu a maior parte da sua vida no lugar de Massas da freguesia de São Pedro Fins do Torno, do concelho de Lousada. A designação daquele lugar de residência depressa passou a ser a sua alcunha, que o próprio assumia com naturalidade e pela qual ficou conhecido em todo o concelho e arredores.

Foi carteiro dos Correios de Portugal até aos 29 anos, altura em que abriu a funerária Massas, em 1956. António “Massas” Fernandes diz no documentário (1994) de Catarina Alves da Costa, sobre a Senhora Aparecida, que na profissão de carteiro ganhava 19 escudos por dia, que mal chegava para a renda da casa que habitou sempre com a sua esposa, Laurinda Augusta Teixeira Malheiro, de Caíde de Rei.

Estabeleceu-se com a firma que ainda hoje existe, a Funerária Massas, através da qual foi um dos principais fomentadores de uma das maiores e mais polémicas tradições na Senhora Aparecida: a Procissão dos Caixões. Embora fosse um aficionado desse culto pagão que se enraizou até 1995 nas festas aparecidenses, António “Massas” Fernandes desincentivou a revolta popular contra a decisão eclesiástica de erradica aquela prática.

Além disso António “Massas” Fernandes foi um dos mais fervorosos promotores da festa em honra da Senhora Aparecida e do seu gigantesco andor.

Desde muito cedo denotou qualidades cívicas e políticas muito úteis para o desempenho de cargos e tarefas públicas. Filiou-se no Partido Socialista (PS) após o 25 de Abril, participando ativamente na campanha eleitoral para as primeiras Eleições Autárquicas, realizadas em 12 de novembro de 1976 e nas quais concorreu na lista do PS liderada por Belarmino Fortuna, um contabilista e agente sindical da antiga Fabinter, que perdeu as eleições para Amílcar Neto, que concorreu pelo PSD.

António “Massas” Fernandes foi eleito nesse sufrágio para o cargo de vereador da Câmara Municipal, juntamente com o referido cabeça-de-lista e o médico António Carlos Pacheco, todos pelo PS e os sociais-democratas Amílcar Neto (Presidente), o professor Anastácio Leão, António Gomes Ribeiro e Paulo Afonso da Cunha.

Nas eleições autárquicas seguintes, realizadas em 16 de dezembro de 1979, António “Massas” Fernandes voltou a ser eleito para vereador apesar de nova derrota do PS, que além daquele elegeu para a vereação o cabeça-de-lista derrotado António Carlos Pacheco e ainda João Augusto Alves. Por seu lado, a Aliança Democrática (que integrava o PSD, o CDS e o PPM) elegeu Amílcar Neto, Jaime Moura, Armando Queirós e Artur Pinto Paiva.

Em ambos os mandatos António “Massas” Fernandes destacou-se pelo seu caráter estoico e sagaz na luta pelo bem comum, características que foram apanágio da sua pessoa nas várias vertentes da sua intensa vida pública.

Exímio jogador de damas

A partir de 1993, este aparecidense passou a dedicar-se essencialmente à sua freguesia, onde foi Secretário da Junta presidida pelo seu amigo e social-democrata Júlio Mesquita. Este aparecidense na presidência do clube e António “Massas” Fernandes no lugar de vice-presidente formaram dupla à frente do Aparecida Futebol Clube. A eles se devem vários feitos significativos designadamente a criação do original campo de futebol.
“O meu tio era um apaixonado pelo futebol do Aparecida e até pedia dinheiro emprestado para investir lá se fosse preciso”, comenta o seu sobrinho e herdeiro, Carlos “Massas” Fernandes.

Em 1989, António “Massas” Fernandes foi eleito presidente da junta do Torno, cargo onde se manteve até à sua morte, em 20 de outubro de 1997, tendo vencido inequivocamente todos os atos eleitorais que o elegeram. “Foi um autarca elogiado por todos e igualado por ninguém”, afirma aquele sobrinho que foi também o seu sucessor na Junta de Freguesia.

Nos seus tempos livres dedicava-se intensamente a uma das suas maiores paixões: o jogo de damas. “Quando à noite não se sabia dele, nos tempos de poucos telefones e nenhuns telemóveis, era procurá-lo num qualquer café aqui na Aparecida ou no café São Pedro, de Caíde de Rei, ou noutro café de Macieira, onde ele gostava de jogar damas”.

Curiosamente, naquele documentário televisivo de Catarina Alves da Costa (1994), uma das filmagens iniciais mostra António “Massas” Fernandes a jogar damas num café da Senhora Aparecida.

Um homem simples que viveu para a sociedade e mis não fez porque faleceu aos 71 anos de idade, em vésperas das eleições autárquicas de 1997.
“Fazia tanto e queriam fazer ainda mais de uma forma que se esquecia de coisas básicas”, conta Carlos “Massas” Fernandes, que apelida o tio de despassarado e distraído. “Focado em coisas importantes, ele perdia a noção de certas coisas como deixar abertas portas e janelas do carro e até mesmo deixar as chaves na ignição e ir à vida dele”, relata este sobrinho.

José Carlos Carvalheiras

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