O desconfinamento terminou e com ele aquele sentimento de solidariedade e entreajuda que muitos auguravam como o novo paradigma da humanidade pós covid. O mundo mudaria para uma sociedade mais humanista e sobretudo mais ecologista. Teríamos aprendido com os meses em que estivemos fechados, onde as palavras e até os atos foram por vezes altamente inspiradoras. Na altura disse e escrevi que a profecia de Hegel, a de que a história confirma que nada aprendemos com a história, iria prevalecer e que de fato não iriam acontecer as mudanças que tão candidamente, qual resposta de criança ou de concorrente a um qualquer concurso de beleza, poderiam indicar como direção.
À medida que as medidas que os governos colocaram em prática para manter a ordem social, prevenindo toda uma série ações incontroláveis de pessoas que de um momento para o outro teriam perdido o seu rendimento, a incerteza e o medo vai-se apoderando senão de todos, pelo menos destas pessoas.
Passados todos estes meses, percebe-se que não existe uma resposta concreta e sobretudo que possa ser dada de forma conjunta aos efeitos de uma pandemia que teima em não deixar-nos.
A ciência parece mais interessada em tudo que possa constituir um negócio, os políticos interessados em satisfazer as suas clientelas e se possível angariar mais. A prioridade é olhar pelos seus.
Aquilo a que muitos chamam humanismo, só o é enquanto a pessoa possua o estatuto de cidadão do estado, estatuto este, que para alguns só existe para o estado que eles defendem.
O medo e a incerteza, enxertados na ignorância, levam as pessoas a fechar-se naquilo que elas consideram como fundamento de vida. O fundamentalismo vê a sua raiz alimentada pelo mais malcheiroso dos estrumes.
As soluções, por todo lado, são na direção do cercear, do limitar, do confinar – sobretudo o pensamento.
Ao invés de diariamente tentar suprir as populações com aquilo que elas parecem desejar, os nossos dirigentes, deveriam estar já com planos concretos desenhados para todo o tipo de cenários, já que há dados que os permitem. Qualquer planeamento possui, ou melhor, deve possuir componentes de contingência para os quais deve existir uma resposta.
Não serve dizer que tudo é muito imprevisível, que se está a fazer o melhor, que não se consegue homogeneidade nas ações, etc. O ato de governar, seja o que for, deve ter uma linha de atuação que permita fazer face às contingências da vida. Elas existem, não acontecem só aos outros. A própria falta de homogeneidade naquilo que deveria constituir uma resposta conjunta é em si mesma uma contingência para a qual é necessário haver um plano que lhe dê resposta.
Linhas de rumo são absolutamente essenciais para acabar com climas de incerteza e mitigar medos. O receio de que este ou aquele plano possa falhar não pode existir, pois aumenta a incerteza. Ter uma linha é afirmar resolução, é dar uma direção que as pessoas podem seguir. Esta perceção é absolutamente fundamental num quotidiano que rege realidades micro por perceções macro.
Assim o verdadeiro combate a algumas patologias da sociedade, as possibilidades do aumento da discricionariedade, que têm sobressaído nos últimos tempos faz-se a partir da coragem de criação de direções sem desvios, incluindo necessariamente o combate à ignorância, que mesmo não concordando todos percebam que está ali um alicerce de uma estrutura que serve de suporte aos anseios das populações e sobretudo, da cimentação de um verdadeiro humanismo, aquele que se foca no indivíduo e não na sua qualidade sócio- política.
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