Uma conversa com um amigo, um filme ou a influência dos familiares poderá ser o suficiente para mudar a alimentação e os estilos de vida? Para Adriana e Joana, duas jovens lousadenses, parece ter sido o suficiente para deixar o peixe, a carne o os derivados de produto animal.
São vários os mitos em torno dos regimes alimentares como o vegetarianismo ou veganismo. Será que os vegetarianos não consomem proteína suficiente? A alimentação vegetariana será mais saudável? Todos os vegetarianos têm de tomar suplementos de vitamina B12? Comer vegetariano é mais caro? Seja por questões éticas, ambientalistas ou de saúde, há cada vez mais pessoas a migrarem de uma dieta omnívora para uma à base de plantas. Estima-se serem cerca de 120 mil portugueses, o que corresponde a 1,2% da população.
Adriana Moreira tem 22 anos e é vegana. Começou por ser vegetariana quando tinha 15 anos, por influência do pai, que também é vegetariano há mais de 20 anos. Foi vegetariana durante quatro anos, por se sentir “um bocadinho hipócrita por continuar a consumir produtos lácteos e ter consciência que isso causa sofrimento aos animais”.
Por pressão familiar e social sentia-se “frustrada e era complicado para mim estar sempre a ser a ovelha negra que fica de parte nos convívios”, explica, tendo voltado a comer carne durante dois anos. Contudo, como não se sentia bem tanto a nível corporal, porque afetou a sua saúde, como a nível moral, voltou a adotar uma dieta omnívora há dois meses e, desta vez, optando por ser vegana.

Embora as opções alimentares sejam semelhantes, são regimes diferentes e que podem ir além da alimentação. Um vegetariano é alguém que se alimenta de cereais, sementes, frutos, legumes e leguminosas excluindo carne, peixe e mariscos, mas pode incluir ou não alimentos derivados de animal, como os ovos, leite ou mel. Ser vegano é um estilo de vida onde são excluídos todos os produtos de origem animal.
“Há muita gente que pensa que os vegetarianos e os veganos têm necessariamente falta de proteína e, aliás, essa é uma das primeiras abordagens que as pessoas normalmente têm, fazem sempre essa questão”, afirma Adriana, explicando que a proteína é “das coisas mais fáceis de obter”.
Antes de adotarem qualquer um dos estilos, a jovem aconselha a que se informem, “porque, de facto, se não tivermos cuidado podemos carecer de certas vitaminas, mas isso acontece em qualquer tipo de alimentação, temos de ter cuidado para ter uma alimentação equilibrada”.
“Normalmente, a única vitamina que pode mais carecer numa alimentação, principalmente vegana, é a vitamina B12, que é uma vitamina de origem animal e vem nos produtos lácteos, como o queijo. No entanto, essa vitamina é também naturalmente produzida no nosso organismo, por isso é que é importante termos uma alimentação equilibrada”, alerta a jovem.
Com a finalidade de substituir a carne, Adriana utiliza os brócolos, espinafres, feijão, grão-de-bico, a soja, “que também é muito utilizada na alimentação vegetariana”, massa e arroz. Para fazer refeições em Lousada, “não é muito difícil, porque conseguimos encontrar legumes em qualquer parte. Tem sido cada vez mais fácil, porque os supermercados estão a adotar cada vez mais a introdução de produtos vegetarianos e veganos”, menciona.
“Pode dar mais trabalho encontrar diferentes refeições, é preciso sermos criativos para encontrarmos pratos diferentes”.
O que considera ser mais difícil é encontrar as alternativas ao queijo, “que dificulta os lanches e pequenos-almoços”, que, na prática, é o que difere a vegetariana da vegana. “Mesmo se for lanchar com amigos é mais difícil encontrar opções que se adequem, mas há sempre soluções como as geleias. Há sempre soluções”, explica, referindo que o é preciso “é haver força de vontade”.
Para encontrar refeições em restaurantes, Adriana assume que é “um bocado difícil”, porque, acredita, “as pessoas ainda não estão muito bem informadas, já me aconteceu muitas vezes chegar ao restaurante e as pessoas oferecerem-me atum e coisas assim, mas uma refeição é só uma refeição. Espero que lentamente as pessoas e os restaurantes comecem a incluir essa opção, porque de certa forma pode atrair mais clientes”.
Se é mais caro adotar uma alimentação vegetariana? Adriana acredita que não. No entanto, “pode dar mais trabalho encontrar diferentes refeições, é preciso sermos criativos para encontrarmos pratos diferentes. O que é mais caro acho que são as alternativas ao queijo e a maionese”, reflete.
Quando a alimentação se transforma num estilo de vida
Também Joana Taipa, de 23 anos, adota um regime vegetariano há cerca de quatro anos. Aos poucos, foi eliminando a carne e o peixe das refeições e, mais recentemente, todos os derivados de animais. “Não como nenhum animal, não bebo leite e não como ovos, a não ser que seja alguma coisa feita com ovos, por exemplo as bolachas ou um bolo, como, mas cada vez menos, mas ovos mesmo e leite não o faço”, explica a jovem que, atualmente, está a fazer a transição para o regime vegano.
Não teve nenhuma influência direta para mudar, mas vídeos e documentários deram alguma ajuda para dar o próximo passo. “Já queria há muito tempo e nunca o fazia. Quando fui para a faculdade e tinha de fazer a minha comida disse ‘está aqui a oportunidade’, não vou comprar carne nem peixe. Fazia massa com salsichas veganas, queria gastar o menos dinheiro possível e a maneira que arranjei foi deixar de comprar carne e peixe, gastava muito menos dinheiro”, conta, referindo que é “mesmo uma questão moral”.
O objetivo é tornar-se vegana, tanto na alimentação, como no estilo de vida, ou seja, não consumir nada que seja testado em animais ou derivado de animal, mas vai eliminando produto a produto. “Ainda não cheguei a essa fase, estou muito na alimentação, claro que podes fazer as duas coisas ao mesmo tempo, mas penso muito mais na alimentação do que nesse aspeto”, considera.
A paixão pelos animais foi o principal motivo de ter adotado este estilo de vida: “a minha primeira razão são os animais, porque gosto de animais e para mim não faria sentido eu comê-los. É aquela história do ‘eu tenho um cão em casa e gosto dele como gosto de uma vaca ou de um porco’, para mim têm todos direito à vida, então não acho justo, para mim faz-me muita confusão, porque eles sentem dor”.

Há, ainda, mais duas razões: o meio ambiente e, em última circunstância, a saúde. “Nunca fiz isto por mim ou para adotar uma dieta, ou para emagrecer ou engordar, ou para ser mais saudável, nunca foi esse o objetivo, até porque eu não sou muito saudável. Sou daquelas vegetarianas que come muita fast food, se puder, e muitos doces, foi mais pelos animais e pelo meio ambiente”, confirma.
“A questão do saudável é mesmo mito, porque há imensas coisas veganas, acho que as pessoas se esquecem que o açúcar é vegano e eu como muitas gomas veganas, por exemplo, e não são nada saudáveis.”
Mas os vegetarianos têm ou não falta de vitamina B12? Joana explica que, mesmo adotando essa alimentação, tem tudo dentro da normalidade. “Fiz análises há pouco tempo e está tudo perfeito, a vitamina B12 está bem, tenho um bom colesterol, está tudo direitinho. A questão do saudável é mesmo mito, porque há imensas coisas veganas, acho que as pessoas se esquecem que o açúcar é vegano e eu como muitas gomas veganas, por exemplo, e não são nada saudáveis”, revela.
“Faço bolos veganos em casa, em todo o tipo de fast food há uma opção vegetariana, acaba por não ser muito saudável. Não se é necessariamente mais saudável, mas há uma tendência para se ter melhores valores em algumas coisas, mas não sou especialista. Conheço pessoas que adotaram uma alimentação vegetariana por saúde, por isso acredito que realmente melhore alguma coisa em alguns níveis” testemunha.
Admite não ter sido vítima de discriminação, porém, já recebeu alguns comentários que considera desagradáveis. “Mas acho que acaba por ser mais machismo do que contra pessoas vegetarianas, por exemplo, um dia uma senhora disse-me que não devia ser vegetariana, porque um dia vou casar-me com um homem e tenho de cozinhar para ele e vai ser muito chato, porque ele não vai querer comer a minha comida. Isso foi: ‘não estou a criticar-te por seres vegetariana, estou a criticar-te, porque não vais trabalhar para o teu marido’, foi assim que entendi”, lamenta.
“Também já ouvi um outro comentário e direcionado a outras pessoas que é, por sermos vegetarianos é uma falta de respeito para com as pessoas que não tenham nada para comer, que não têm acesso a uma dieta vegetariana, o que eu não considero como uma ofensa, acho que parte mais da ignorância, no sentido lato”, explica, garantindo que não gasta mais dinheiro por ser vegetariana.
Para uma melhor adaptação, a jovem começou por fazer comida para toda a família, de forma a mostrar “que havia coisas muito boas vegetarianas e eles adoraram. A minha mãe diz que se não fosse pelas outras pessoas que vivem cá, podíamos comer todos os dias e ela adora, é capaz de fazer uma semana inteira comida vegetariana para toda a gente, por isso, pelo menos na minha família, foi fácil e provam coisas que não estavam nada à espera que seja bom”.
Sobre a dificuldade de ir a restaurantes e fazer refeições fora de casa, Joana explica que “se és vegetariano é muito mais fácil, porque consomes queijo e se consomes queijo o problema está praticamente resolvido em quase todos os restaurantes”.
E acrescenta que as maiores dificuldades estão nas pastelarias, “pelo menos é o que sinto, porque já faço pequeno-almoço vegano, já não costumo comer bolos de pastelaria nem nada e se decidirmos tomar o pequeno-almoço fora nunca consigo comer grande coisa, porque em princípio vai ser um pão com manteiga que não é vegetal e um sumo de laranja, porque leite era uma coisa fácil de terem disponível e nunca há”, menciona.
No fundo, não somos o que comemos, mas o que escolhemos para comer pode dar indicações sobre onde queremos ir. Para as jovens, o propósito é seguirem os seus valores e ética pessoal.
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