Era o tema que dominava as atenções do mundo até à pandemia provocada pela Covid-19. O crescimento em flecha do turismo atingia níveis de massificação e, em alguns pontos do país, provocava efeitos negativos para os residentes. Embora em Lousada não fosse notório estes efeitos negativos, o Turismo registava valores de desenvolvimento satisfatórios e promissores para o concelho.
De um momento para o outro, o setor do turismo fecha 2020 com uma crise histórica: Portugal registou no ano passado o valor mais baixo de dormidas e chegadas internacionais em 30 anos. Os destinos em todo o mundo receberam menos um bilião de chegadas internacionais em 2020 do que no ano anterior, devido a uma queda sem precedentes na procura e restrições de viagens generalizadas, que se compara à queda de 4% registada durante a crise económica global de 2009.
Embora a trabalhar, “tivemos de nos adaptar, e em Lousada fomos logos dos primeiros a ser confinados. Foi o tempo que estive de estar em lay-off, 20 dias, mas começou também a aparecer serviço internacional, porque não havia aviões. E trabalhamos bem em abril, maio. Depois voltou a parar mais um pouco”, explica Tito Brandão, sócio-gerente da Penatravel, que faz todos os serviços na área do turismo, assim como de agência e transportes.

Com as escolas fechadas, a palavra de ordem é adaptação. “Deixamos de fazer o transporte escolar, mas temos os transportes de trabalhadores das fábricas. Como não estava só com o turismo, não foi muito problemático. Implementaram a regra dos transportes apenas com um terço, depois dois terços, que nos limitava muito”, refere.
A limitação da lotação acabou por condicionar a atividade. “As pessoas queriam retomar a normalidade dos passeios, o que não se podia fazer e tornava-se complicado porque tornava-se mais caro. Ainda é uma medida em vigor e não sei por que ainda não alteraram isso uma vez que nos transportes escolares e nos transportes em serviços de carreiras, até nos aviões, vai tudo com a lotação a 100%”, lamenta.
“O serviço ocasional baixou muito e também no verão houve uma quebra muito grande”, refere Tito Brandão, mencionando que todas as pessoas com serviços marcados foram reembolsadas e notou-se um aumento do turismo rural e do turismo do interior: “as casas do turismo de habitação do interior venderam-se muito bem”.
“A parte do turismo morreu. Tenho colegas, que tinham só carros no turismo, nunca mais trabalharam.”
Sem saber muito bem o que esperar, foram das primeiras empresas a fazer o transporte de trabalhadores para o estrangeiro, onde “encontramos algumas dificuldades por causa da legislação que estava em vigor para entrar nos outros países. Tivemos de nos informar sobre isso tudo, porque as empresas não sabiam. Não havia informação de ninguém”.
“Não comíamos em lado nenhum, porque estava tudo fechado. Tínhamos de dormir nos autocarros, porque os hotéis estavam fechados. Tínhamos de levar comida daqui para lá, durante 4 dias”, recorda o sócio-gerente.
Este mês, pararam todos os transportes escolares, mas mantém-se o transporte de trabalhadores de fábricas. “Tinha 10 autocarros na estrada, ultimamente tinha cinco e agora tenho dois. Tenho um carro para cada lado, para não haver o problema de andar sempre a trocar e a desinfetar, cada serviço tem o seu”, confirma.
As quebras são grandes, mas Tito Brandão espera e pensa não ter prejuízo, “que é uma coisa que não é normal. Sempre fui gerindo o trabalho e controlando as despesas e aproveitar o facto do lay-off, para não mandar os empregados embora. Tenho cinco em casa”, lamenta.
“A parte do turismo morreu. Tenho colegas, que tinham só carros no turismo, nunca mais trabalharam. Estávamos a desenvolver, em parceria com a rota do românico, um programa para cativar o turismo para Lousada. Temos algumas parcerias com o turismo de habitação, para fixar aqui, porque o turismo em Lousada é de passagem. Parou tudo”, afirma.
Fronteiras controladas e viagens canceladas
O aumento dos casos de covid-19, o fecho e o controlo das fronteiras e o cancelamento de voos, está a trazer uma crise ao setor das agências de viagens. A “B THE TRAVEL BRAND”, agência de viagens sediada em Lousada, viu todos os seus serviços afetados pela pandemia.
“Somos uma Agência de Viagens que trabalha como intermediária entre seus clientes e determinados prestadores de serviços turísticos, como companhias aéreas, hotéis, cruzeiros, rent-a-car, entre outros, com o objetivo de vender produtos e serviços relacionados com essas viagens a um preço e com determinadas condições, especialmente atrativas”, explica Joana Borges.
“O setor das agências de viagens e operadores turísticos foi o mais penalizado pelas quebras de atividade provocadas pela pandemia de covid-19 e está a ser o que enfrenta mais dificuldade para recuperar.”
A prestar serviços de emissão de bilhetes de avião, meios de hotelaria, serviços recetivos, locais de entretenimento, seguro de viagem, documentação de viagem e pacotes turísticos, viram-se obrigados a paralisar todo o tipo de serviço e, no limite, dispensar funcionários.

“O setor das agências de viagens e operadores turísticos foi o mais penalizado pelas quebras de atividade provocadas pela pandemia de covid-19 e está a ser o que enfrenta mais dificuldade para recuperar”, afirma, registando uma quebra superior a 85%.
De um momento para o outro, “tivemos de fechar tudo e ficar em teletrabalho com cancelamento de viagens e reembolsos e clientes a questionar a toda a hora a situação das suas férias/viagens e não tínhamos todas as respostas, nem como proceder”.
Nos dias que correm, “tentamos adaptar-nos à nova realidade, embora ainda não seja fácil face à situação atual”, lamenta.
Hotelaria e restauração – inovar para sobreviver
No alojamento turístico, o panorama também não é melhor. O Estrada Real – Hotel mantém o funcionamento há 35 anos, passando de geração em geração. “Tem a parte de restauração, de hotelaria, o catering e a tradição de vender doces regionais”, explica Cláudio Carvalho, quarta geração dos proprietários.
Com 30 funcionários efetivos, mais os “chamados part-time, que também saem prejudicados desta situação”, ainda não dispensou nenhum funcionário. Uma parte da empresa está em lay-off, outra a trabalhar “a 20%” e “vão-se redobrando alguns funcionários”.
“Durante todos estes anos de empresa, foi a primeira reunião que tivemos em conjunto todos os funcionários com a entidade patronal, ainda não sabíamos nada sobre apoios, mas prometi que os iria ajudar até ao fim do ano, que toda a gente tinha os postos de trabalho e os ordenados garantidos, acontecesse o que acontecesse e prontifiquei, se algum tivesse dificuldades eu iria ajudá-los, porque até agora ajudaram-me eles”, garante.
Segundo o proprietário, “é uma empresa estruturada e com os alicerces fortes, mas isto é uma pancada muito grande para um restaurante que tem 30 funcionários fixos, mesmo a nível nacional, já são grandes restaurantes. Se o Estado nos deixar trabalhar, nós trabalhamos, mas alguns vão ter dificuldades em retomar”.
Na restauração, “há muita quebra, que é acentuada com a restrições que nos foram impostas”, na hotelaria, “somos uma empresa que tem muitos viajantes, os emigrantes que não têm residência ou que trazem amigos, prestamos estadia aos nossos eventos e aos que nos rodeiam e, logicamente, a taxa de ocupação não foi aquela que nós queríamos”.

No geral, e envolvendo todos os setores, o Estrada Real regista uma quebra de 60%, “muito acentuada”, lamenta, explicando que a quebra “sente-se mais nas festas, porque trabalhávamos bem”.
Apesar da diminuição das vendas, Cláudio Carvalho aproveitou para investir e restaurar o restaurante: “inovei para estar preparado para o pós-covid” e foram adaptando as medidas à situação em vigor.
“Quando reabriu, em junho, fomos-nos preparando para as leis e preparamos todas as coisas para receber bem os clientes e em segurança”, testemunha. Nos últimos meses do ano, adotaram o sistema take-away e entregas ao domicílio.
“Para pararmos, há muita gente que tem de trabalhar e, se calhar, uma das grandes lacunas do Governo é não pensar que este setor tem de trabalhar, há pessoas que andam na rua que têm de trabalhar, há enfermeiros, há médicos, há pessoas que fazem entregas ao domicílio e essas pessoas têm de comer.”
“O take-away é muito importante, não só para as pessoas comuns, como para as pessoas de idade, que não têm necessidade de fazer comida quando é apenas uma pessoa ou duas. Para pararmos, há muita gente que tem de trabalhar e, se calhar, uma das grandes lacunas do Governo é não pensar que este setor tem de trabalhar, há pessoas que andam na rua que têm de trabalhar, há enfermeiros, há médicos, há pessoas que fazem entregas ao domicílio e essas pessoas têm de comer”, alerta.
Cláudio Carvalho garante que mantém a estrutura aberta a pensar nessas pessoas: “se fossemos a fazer contas, era preferível fechar a empresa, mas também temos, perante a sociedade, essa responsabilidade. Em vez de ganharmos, se tivermos de perder, perdemos, porque até agora ganhamos, no bom sentido da palavra”.
“Estamos a atravessar uma situação realmente complicada em termos de empresas, todas as áreas, mas nós, restaurantes, podemos prestar um serviço à sociedade, ajudando o enfermeiro que trabalha 12 horas, por exemplo. Claro que a nossa margem de lucro é muito menor” confessa.
O proprietário acrescenta ainda: “não nos podemos esquecer que em 2009, o turismo, a hotelaria e a restauração é que ajudaram o país a sair da situação de crise. Vivemos com o bem de todas as outras empresas, se as outras áreas não estiverem bem, isso reflete-se também nas estruturas de hotelaria, porque ainda vivemos muito com o mercado nacional”.
Cláudio Carvalho não tem dúvidas, “para este país voltar à grande economia, têm de ser os hotéis, a restauração, as festas, porque isso é que vai fazer o país voltar a sair do buraco”.
O que o país tem agora pela frente é a perspetiva de meses duros até à primavera deste ano, altura em que se prevê alguma recuperação no turismo, e de forma mais lenta nos destinos urbanos.