É comum, hoje, aparecerem na mesma frase as palavras discriminação e integração. Se não na mesma frase, pelo menos, no mesmo parágrafo, no mesmo discurso. A antinomia é por demais infame: a própria palavra integração implica discriminação.
Integrar significa completar – tonar um só – , mas, mesmo quando falamos de humanidade, completamos o quê? Se alargarmos o âmbito e falarmos do mundo, completamos o quê? Está fácil de ver que integrar, implica a existência de domínio, na sua ambivalência de demarcação e poder: aquilo a que, por exemplo, Bourdieu , chama campo. Todo aquele que ser “integrado” vê-se constrangido pela necessidade da devida autorização. No fundo, falamos da necessidade de reconhecimento de dentro para fora e vice-versa : dentro deve reconhecer-se o que está no exterior ao domínio; o que está fora reconhece o domínio como objetivo de pertença. Autorização na forma de reconhecimento requer, assim , uma relação de subordinação, o domínio assume plenamente o seu significado de poder.
Significa então que, quando se fala de integrar, se discrimina porque o que vale é o domínio de quem integra. Paradoxalmente, o que ser integrado aceita, mesmo que tacitamente, esse domínio. Veja-se o que acontece com grande parte dos feminismos, das ideologias de género, das questões raciais, inclusive, das questões de condicionamento físico: pretende ser-se como aquele que se reconhece como dominante e não como se é: a aceitação exigida não é a de que “eu sou um humano, como todos somos”,“ eu sou um ser que constituo o mundo, o universo, como tudo o que me rodeia”, mas sim, “tenho o mesmo direito que aquele”, e ter o direito é o mesmo que ter poder. Não importa como se integra, seja por caridade – uma espécie de compaixão hierarquizada -, seja por uma série de compensações artificialmente induzidas. A dignidade humana, construída sob princípios abstratos, sofre derrota sobre derrota. Nessa perspetiva, o oxímoro da integração é bem evidenciado: o que, muitas vezes, se chama dignidade humana não passa de uma igualação, de uma massificação informe.
O solipsismo imanente à formação do domínio é ilegítimo, porque a experiência do mundo de uns não autoriza à sua imposição a outros. Tem de ser ultrapassado. A necessidade de reconhecimento no outro, essa característica tão humana, terá que ser preenchida numa perspetiva universalizante. Esse ato de reconhecimento , que parece tão simples, mas que é de uma complexidade extrema, terá que, forçosamente, ser objeto de “treino”, “educação”, para que dualismos – relação que implica dependência – de qualquer espécie, portanto, situações de discriminação deixem de fazer sentido. A partir do momento que todos tenhamos capacidade de reconhecer “o outro” em qualquer ser de qualquer tipo e espécie que compõe o universo na sua singularidade, estou certo, de se escancarem as portas à solidariedade e, dessa maneira, gerar um humanismo, esse, sim, alicerçado nos princípios da Liberdade, Igualdade e Fraternidade!
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