Ciclicamente, qual efeito de catarse comunitária, aparecem as soluções para as desigualdades a partir de quotas a impôr, para presumível integração de camadas da população desfavorecidas.
Catarse, porque especialmente as comunidades Ocidentais não se conseguem desvincular da sua história pejada de discricionariedades a todos os níveis : de género, raça, classe social, etç ; pretendendo de alguma forma proceder a algumas correcções.
Convém , no entanto, tentar fornecer um conceito de igualdade, algo que não existe na natureza, mas que poderemos definir em senso clássico, ou formal, como o resumo dos primeiros sete artºs da Declaração dos Direitos Humanos , que se consubstancia na anulação de qualquer tipo de distinção,”nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação”.
No entanto , com o evolução do estado liberal, para o estado social, percebe-se que esta definição formal, não é suficiente para garantir a isonomia que os sistemas constitucionais procuravam, não se alcançando as pessoas socialmente desfavorecidas de modo a proporcionar-lhe as oportunidades de que dispunham as favorecidas. Era necessário criar uma forma de ambos possuírem as mesmas condições.
Deste modo houve que juntar ao conceito formal , o conceito material , ou seja, precisamente o de juntar o preceito de todos possuírem as mesmas condições para poderem aceder às mesmas oportunidades.
Para isso, o Estado , agora já dito, Social, passará a garantir a igualdade a partir de desigualdades.
É a aplicação dos conceitos de justiça de Aristóteles , justiça distributiva e justiça correctiva. A primeira justiça que se baseia numa distribuição geométrica, numa distribuição proporcional, de acordo com os méritos de cada um , de forma a manter a sociedade hierarquizada e a segunda numa distribuição aritmética,numa ação corretiva para restabelecer o equilíbrio rompido entre particulares.
Percebe-se que é então a partir daqui que aparecem as ditas discriminações positivas, que podemos definir de forma sumária, como um conjunto de políticas públicas e privadas de caráter compulsório, facultativo ou voluntário, concebidas com vista ao combate à discriminação racial, de género e de origem nacional, bem como para corrigir os efeitos presentes da discriminação praticada no passado, tendo por objetivo a concretização do ideal de efetiva igualdade de acesso a bens fundamentais como a educação e o emprego.
Ora , como está bom de ver, não é fácil fazer um juízo bem definido deste tipo de ações e sobretudo aquilatar da sua bondade e efeitos práticos.
No que me diz respeito, as desigualdades acima elencadas, não fazem sentido quando se pretende debatê-las numa base de militância, isto é , tipo discussão de futebol, discussão partidária etc. Não ! Só faz sentido estas desigualdades aparecem nos debates, como algo de que cujo princípio , já partimos, elas já não se encontrem incrustadas na nossa sociedade e portanto todo o debate partirá da premissa de inclusão de todos sem excepção. Devo até confessar que esses discursos de desigualdade me enfastiam um pouco e que não raras vezes se direcionam a obter vantagens ou , o que ainda pode ser pior, o pretender agarrar pseudo causas por falta de ideias, dando a sensação de uma arrogância intelectual, que é de todo vazia.
Posto isto, de forma rápida, analisemos esta coisa das quotas.
Em primeiro lugar para se criar condições para igualdade, teria de haver uma norma a partir da qual se pudesse medir a desigualdade de cada um, tal não existe.O que é que existe que possa servir de justificação para garantir uma desigualdade de tratamento no sentido positivo a uma mulher, a um gordo, a um careca, a um preto , a um cigano , a alguém possuidor de deficiência , etç, que possa ser comparado ?
Depois, será que ao definirmos quotas, como por exemplo foi sugerido ultimamente, para pretos e ciganos no acesso ao ensino superior , isso garante que eles vão ter as mesmas oportunidades que os mais favorecidos ? Ou vão ter acesso ás oportunidades daqueles que tendo acesso continuam a ser os menos favorecidos ? O rico que pode pagar um colégio particular de alta performance, o que tem um ambiente familiar mais propício ao seu desenvolvimento intelectual , enfim todo aquele que tem acesso a todas as ferramentas para ser incluído na franja mais favorecida da sociedade, não sofrerá, a não ser que não queira ou seja completamente inapto, absolutamente nada com as quotas, quem vai sofrer são aqueles que não têm acesso a essas ferramentas , que são diariamente confrontados com realidades que não privilegiam o exercício intelectual.
Este tipo de reflexão pode ser aplicada a qualquer tipo de desigualdade !
Contudo, e há sempre um mas, se estamos de acordo,que as desigualdades devem ser eliminadas pela consciencialização social, conseguida sobretudo a partir da formação do ser humano, também estamos de acordo que esse processo é algo moroso, e ainda mais moroso quando pensamos nas políticas educativas incoerentes que vagueiam ao sabor de quem entra no governo.
Aparece então aqui o campo ideal para a defesa da discriminação positiva, como mola de impulso à integração de elementos que se julgam pertencer a estratos desfavorecidos da população, não havendo um critério que defina , sem ser de forma ambígua, quais é que são esses estratos.
Não há dúvida , portanto, que estes critérios de discriminação positiva, de quotas , não podendo ser passíveis de comparação , são na sua essência eminentemente políticos e só políticos.
Será uma forma de atacar o problema pelos seus sintomas e não pelas causas,ignorando-se alguma falta de qualidade do ensino no que diz respeito às matérias de humanidades. Se por um lado sabemos que a solução está na formação humanística , por outro , talvez possa ser fruto de reflexão a adequação de correções, materializadas em ações de discriminação positiva, de forma planeada de forma a imbricar na solução definitiva.
Este é o desafio que deixo esta semana .
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