Os Aparecidenses são “gente séria e boa e que se dá por inteiro a qualquer causa”, padre José Augusto

José Augusto Ribeiro Ferreira, pároco desde 2001, celebrou a missa nova em Ferreira, Paços de Ferreira, de onde é natural, e depois em Santo Tirso. Com 43 anos, é há 18 anos pároco nas freguesias do Torno e Cernadelo (Lousada) e Aião (Felgueiras).

O pároco recorda a chegada à freguesia do Torno: “Foi depois das festas que cheguei aqui, a 23 de setembro. Foi aquela sensação da terra que eu vou servir, sem ter a noção do que se vivia aqui. Encontrei gente boa. Eu vinha cheio de entusiasmo e vontade. Era o meu início de ministério de serviço”.

As primeiras impressões foram positivas, embora soubesse de antemão que vinha substituir um padre novo, cuja saída tinha surpreendido a população, ainda apegada ao anterior pároco. “Mas este saudosismo acabou por passar naturalmente”, diz.

O bairrismo e o apego à terra, associados ao entusiasmo e alegria foram desde o início as notas dominantes de uma relação que tem quase duas décadas. Dos aparecidenses diz serem “gente séria e boa e que se dá por inteiro a qualquer uma das causas, desde que as mesmas sejam válidas. Fui sempre muito estimado, amado e estimulado, é gente que cuida e bem e tem bairrismo nas coisas que faz, um bairrismo sadio, de alguém que gosta da sua terra e que faz por ela o que for preciso”, descreve.

Santuário da Sra. Aparecida: “uma grande aventura”

Quando chegou, o padre José Augusto começou por estudar o santuário enquanto local de peregrinação, para lhe dar uma maior amplitude: “O santuário era a ermidinha da Senhora Aparecida, que abria uma vez por semana ao domingo e eu achei quer era importante fazer o registo do número de pessoas que o iam visitando, tentando dar-lhe alguma amplitude”. Concluindo que existia uma envolvência muito grande e muita devoção à Senhora Aparecida, desenvolveu um estudo exaustivo daquilo que era o espaço para fazer dele um santuário, o que implicaria uma obra de fundo muito grande. “Foi uma das maiores aventuras da minha vida, pois construímos o santuário em apenas cinco semanas. Isto virou-se tudo do avesso. A fábrica da igreja não tinha dinheiro para isso, mas decidimos e assim o fizemos. Foi uma coisa megalómana, mas ficou pronta e tudo se resolveu, quer a questão financeira, quer todas as outras questões, com uma ajuda muito importante, quer da Câmara quer da Junta de Freguesia e da população toda, que se uniu à volta deste projeto”, conta.

O pároco recorda que as obras começaram em julho e, no dia 8 de agosto, o santuário estava aberto às pessoas. Trata-se de uma obra que custou 250 mil euros e que começou sem haver dinheiro, mas “graças a Deus ficou tudo resolvido”. Esta obra, considera o padre José Augusto, mudou a rotina das pessoas, da comunidade e das comunidades envolventes. “Hoje é unânime: a visita à Aparecida é a visita ao santuário e o santuário aparece como o marco central da vila”, explica, lembrando que a terra era uma aldeia na altura. “Esta exposição do santuário e da Senhora Aparecida tudo mudou, pois nem sequer tínhamos como rezar à Senhora Aparecida. Temos agora uma saudação, não tínhamos uma imagem exterior, não tínhamos a lenda com o ermitão, com a história…” Agora é um santuário que reúne peregrinos à volta da mesma fé.

O regresso às origens e o record do Guiness

Em relação à romaria anual à Senhora Aparecida, o trabalho do pároco centrou-se na valorização da essência da festa, que é muito mais do que isso, “pois é um conjunto de romeiros, de peregrinos, que vêm com devoção à senhoria Aparecida buscar aquilo que era tradicional e típico”, explica. O museu que, entretanto, foi criado, tem essa função, de mostrar a essência da festa. “A minha primeira aposta foi essa”, refere, enumerando várias ações com esse objetivo: a bênção das mães, no dia 14; a colocação da imagem no andor; a valoração dos cantares ao desafio, “numa parte religiosa, que é possível”; a questão dos bombos, “o anúncio de que a festa vai começar; as rusgas das concertinas; a feira do cavalo, “que nunca foi possível revitalizar da maneira que era, típica, dar-lhe esse cariz de romaria”. Ou seja, a intenção, segundo explica, foi não tanto procurar uma festa com grandes artistas, mas sim andar à volta do que era típico numa romaria. “Mas depois, a dada altura, surgiu, com o senhor Vieira, que vive em Freamunde, mas é desta terra, a oportunidade da inscrição no Guiness dos andores, tentado que fossem o símbolo central da procissão, e tudo isto foi crescendo”, afirma. Realizou-se, assim, um desígnio difícil de concretizar: “Era muito difícil que uma vila tivesse um nome católico e esta tem, e isso surge desta autenticidade”, defende.

De todos os momentos da romaria, destaca a bênção das mães: “É um momento fantástico, é a bênção da mulher por excelência, da mulher que pode vir a ser mãe e da mãe. Esta festa tinha a base, foi só trabalhar e melhorar”.
Durante dezasseis anos, o padre José Augusto foi o presidente da comissão de festas, mas tudo mudou há alguns anos: “Já era hora de abrir portas e deixar outros prosseguirem. Tem sido uma comunhão sadia comigo, fortalecendo até esses laços. Evidentemente que toda a parte menos católica tem sido revitalizada com muito vigor e entusiasmo, mas o aspeto central da comissão continua a ser o aspeto religioso”, lembra.

Queda do andor: o momento mais difícil

A permanência do padre José Augusto no Torno tem sido feita de bons momentos, mas recorda um difícil, “o mais difícil até hoje”, “quando o andor caiu na procissão, o que ainda hoje recordo. Foi pesado, intenso e difícil. Ver nas pessoas a desilusão e a dor… Depois, graças a Deus, e esta terra tem isso de bom, levantamos a cabeça, arrumamos os cacos, por assim dizer, para que pudéssemos reunir de novo, levantando a cabeça e o espírito para continuar”. Não foi fácil, pois, naquele momento, tudo “desabou”: “Era preciso alguém manter a calma e serenidade, para reunir os homens e para lhes dizer “não”, vão na procissão, vão comigo, não é uma desgraça, é uma bênção, pois ninguém se aleijou. Eu estive em algumas procissões nestes 18 anos de padre e não me lembro de uma procissão com tanta efervescência e com tantos aplausos, como aconteceu nesse dia. Toda a gente, de facto, saudava os homens, que choravam como meninos, sem culpa nenhuma. O que aconteceu serviu para nós percebemos que tínhamos de mudar algumas coisas para a tradição continuar”, defende. De referir que o incidente aconteceu há dois anos e que não se registaram feridos graves. O padre José Augusto conta que a procissão retomou o caminho, “fez o seu rumo e, quando passamos de novo por lá, já estava tudo arrumado, sem vestígios, pois a própria população tratou disso. Até colocamos um dos outros andores cá fora, pois assim o símbolo estava lá. Numa fração de segundos tudo se passou e tudo se resolveu”.

Após o incidente, que o padre vê não como uma desgraça, mas como uma graça e uma bênção, foi possível perceber uma série de coisas: “que era preciso alargar a escadaria, rever o percurso da procissão, estar mais atento ao número de homens que levam o andor. E cada vez mais levamos estes cuidados ao pormenor. Mesmo assim não estamos livres de que possa voltar a acontecer”, salienta. Uma imagem que ficou na memória de todos foi o pároco a caminhar na procissão com a pequena imagem da Senhora Aparecida nas mãos, que não se partiu.

A tradição da corrida e a bênção das motas

A corrida de motos é também já uma tradição na Aparecida por altura das festas. Embora apresente alguns riscos, ninguém quer abdicar dela. Há anos, verificou-se um acidente que fez repensar a segurança. O padre faz uma analogia para lembrar que o correr do tempo obriga a mudanças: “Eu recordo-me que há uns anos não era obrigatório ter cinto de segurança e aqui é exatamente a mesma evolução normal. Refiro-me à segurança nas corridas, temos de evoluir e criar condições melhores para que não existam problemas”, defende.

O padre José Augusto refere que Aparecida “tem uma ligação ao motociclismo numa vertente muito difícil de encontrar noutro sítio do país. “Eu apadrinhei e o convite foi meu, para que no dia 15 de agosto, que é o dia das corridas, se faça a bênção das motos e cada vez tem mais afluência, mais participação”, refere. O São Rafael é o protetor dos motociclistas e, agregados por esta devoção, juntam-se mais de dois mil motards, muitos do Moto Clube, que já têm esta data e este momento como referência. “Não sou motard, mas tornei-me muito próximo do Moto Clube de Lousada, com a realização da Via sacra e na sua concentração. São eles que apadrinham aqui o clube da Aparecida”, conta.

Há novidades na festa deste ano!

O padre José Augusto assume-se como um homem de projetos que acorda “sempre com vontade de fazer alguma coisa”: “Sou irrequieto por natureza e lanço sempre um desafio constante. Tenho desafios sempre para a comunidade, mas o principal desafio para esta gente é fazê-la mais feliz. O objetivo é esse, ao longo destes anos e enquanto eu cá estiver”, afirma.
Por isso, este ano tem mais uma novidade, que vai acontecer nas festas: “Nós vamos criar ao lado do museu uma réplica da pala que identifica o santuário e debaixo vão estar três produtos regionais criados no próprio santuário para venda ao público. Vamos vender azeite das próprias oliveiras do santuário, um licor do santuário, da Aparecida, segundo uma receita antiquíssima, que se procurou reencontrar, e a trouxa do ermitão, que foi um doce criado em específico para o ermitão, simbolizando a trouxa que ele levava com a imagem da Senhora Aparecida, com características próprias, comestível. Esta primeira produção será modesta, moderada, até porque as oliveiras não nos dão muito azeite”, explica.

Desde o início que o padre vive com intensidade a fé à Senhora Aparecida, especialmente a partir do momento em teve a possibilidade de tirar a imagem da ermida para a colocar no andor: “Sinto de facto com uma intensidade muito grande a imagem e as pessoas, pelo carinho e pela dedicação”, confessa. Evocando a oração, em relação à Senhora, diz que aprendemos a chamá-la por ‘querida mãe’. “Isso é significativo”, sustenta.
Na verdade, o apego do Padre José Augusto à Aparecida é grande, a ponto de afirmar que não lhe passa pela cabeça deixar a paróquia: “Desde o dia da minha ordenação que prometi obediência ao bispo, mas não tenho ambições eclesiásticas, gostaria muito de continuar a ser padre nesta terra, onde me sinto bem”, refere.

Para finalizar, o pároco espera que todos usufruam da festa “naquilo que ela tem de melhor, que gozem a festa no seu sentido mais literal e profundo e que percebam – fazendo eco do Papa Francisco quando veio a Fátima – que temos mãe, que é a Nossa Senhora Aparecida. Entreguem-se com devoção a ela e divirtam-se”, recomenda.

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