O momento difícil que vivemos com a situação do COVID-19 traz-nos à memória os acontecimentos sobre as grandes epidemias da História. Entre elas, encontra-se a pneumónica, também conhecida como gripe espanhola, que surgiu em 1918 e, segundo os números mais conservadores, ceifou a vida a mais de 20 milhões de pessoas em todo o mundo e terá afetado cerca de 500 milhões de pessoas.
Não se sabe exatamente a sua origem. Há quem defenda que pode ter vindo da Ásia ou dos EUA, mas também há quem diga que surgiu na Europa. Independentemente da sua origem e da distância que percorreu, a pneumónica chegou a Portugal em maio de 1918. A primeira zona afetada foi o Alentejo aquando do regresso de trabalhadores sazonais vindos de Espanha. Foi o primeiro surto no país… No mês de agosto, em Vila Nova de Gaia, rebentou um novo surto, que rapidamente se espalhou pela cidade do Porto e pelo norte do país. Dada a proximidade a estas regiões, a epidemia não tardou a chegar a Lousada! Foi em meados de setembro que se registaram os primeiros casos de infeção.
Perante a contaminação, a 24 desse mês, a Câmara Municipal aprovou um conjunto de medidas para conter o avanço da pandemia. Assim, deliberou a desinfeção e o branqueamento dos edifícios municipais, devendo obrigar-se os particulares a procederem de igual modo, e mandou que se desinfetasse amiúdas vezes a cadeia e as retretes públicas. Além disso, garantiu junto das farmácias da Vila o pagamento das despesas no fornecimento de medicamentos aos doentes pobres, mediante prescrição médica e atestado de pobreza da junta de freguesia.
Apesar das medidas, no início de outubro, o Jornal de Lousada noticiou que já «grassava com bastante intensidade, embora benignamente, neste concelho, a epidemia da bronco-pneumonia». Detetaram-se alguns casos de contaminação na Vila, mas foi nas freguesias de Nevogilde, de S. Fins do Torno e de Pias que se registaram o maior número de infetados. Perante esta situação pandémica, e de modo a evitar uma maior propagação, também o inspetor escolar da zona cumpriu as determinações governamentais e mandou adiar da abertura das escolas no concelho.
Em meados de outubro, o número de infetados estava longe da gravidade de alguns concelhos vizinhos. No entanto, temia-se que a situação se piorasse pelo facto de existir falta de profissionais de saúde em Lousada. Para além de existirem poucos médicos, alguns tinham ficado infetados, como foi o caso do Dr. Joaquim Hermano, médico facultativo no Hospital de Lousada, que teve de se recolher em sua casa. A agravar as dificuldades de assistência médica, os lousadenses ficaram impedidos de cumprir com as determinações higiénicas impostas pela Câmara devido à falta de cal no mercado para branquear e desinfetar os seus prédios. A situação tornou-se ainda mais difícil com o aumento dos preços dos bens de consumo essenciais. Esta situação levou a Câmara Municipal, em reunião de 15 de outubro, a representar-se ao Governo contra a extinção dos celeiros municipais, que garantiam o abastecimento das populações, e contra a projetada liberdade de comércio dos géneros de primeira necessidade, medidas que iriam originar a especulação dos preços e causariam grande prejuízo às classes proletárias.
O tratamento dos doentes infetados pela pneumónica era feito em casa. Apesar de existir hospital na Vila, nele apenas existiam duas enfermarias – uma para homens e outra para mulheres – não sendo permitido admitir doentes infetocontagiosos, dado que não havia espaços próprios de isolamento. Esta forma de tratamento domiciliário era muito exigente e obrigava os médicos a fazerem grandes deslocações por todo o concelho, facto que levou o município a pedir à Delegação de Saúde um automóvel para o serviço clínico. Devido à carência de recursos, este e outros pedidos, nomeadamente de medicamentos, não foram satisfeitos pelas autoridades. Este surto deu sinais de abrandamento em novembro de 1918.
Pedro Magalhães
Figura – Aspeto da enfermaria dos homens (anos 40)