Ultimamente, quando olhamos para o palco da cena política portuguesa, ficamos com uma sensação ambígua. Das duas uma, ou o drama está a ser dirigido por um encenador completamente alcoolizado ou então a ficção virou mesmo realidade e a sátira política não passa da verdade dos factos.
Ao contrário do que se possa pensar, a peça “Portugal Político” não é (apesar de parecer) uma boa velha comédia, mas antes uma daquelas tragédias gregas onde parte significativa da trama ocorre nos bastidores.
O Governo e a máquina política do PS, com a anuência amordaçada da esquerda radical e o sacrifício silencioso da maioria autárquica socialista, têm paulatinamente monopolizado não só o aparelho público do Estado, mas também a consciência cívica e política da maioria dos portugueses.
Perdemos demasiado tempo a debater os perigos da doutrinação ideológica da disciplina de cidadania (cuja leccionação me parece, note-se, totalmente legítima), quando, como colectividade, aceitamos apaticamente a “versão da realidade” que o Governo e a maioria no poder nos alimentam todos os dias. Belos números e estatísticas, cuidadosamente estudados pela máquina “publicitária” socialista que, na verdade, não dizem nem mais, nem menos do que aquilo que os seus autores pretenderam dizer.
Ainda mais curiosa é a facilidade com que a argumentação varia consoante as circunstâncias. A pandemia mudou muita coisa nas nossas vidas, mas não alterou a capacidade de retórica do Governo socialista. O mesmo Governo que, com retórica, sobreviveu politicamente à devastação causada pelos incêndios de 2017 e ao maior roubo/recuperação de armas da história.
Hoje, no mesmo exercício dialéctico, servem-nos diariamente ilusões fantásticas sobre um SNS inabalável…. Mas evitam a esse respeito dois pontos essenciais. O real mérito da resposta à pandemia e o impacto nos restantes serviços hospitalares.
Quando ao mérito da resposta, ao contrário do que nos vendem, na verdade, o herói não foi o sistema, mas os milhares de profissionais que, face ao colapso do serviço de saúde mesmo antes do COVID, fizeram um esforço hercúleo para que a resposta médica e hospitalar à pandemia fosse a melhor possível.
Para além disso, a actividade hospitalar normal praticamente estancou. Doentes crónicos sem consultas de rotina, médicos de família sem capacidade de resposta, cirurgias não urgentes indefinidamente adiadas, medicina de reabilitação praticamente suspensa, sector social, lares e hospitais abandonados e uma época gripal mesmo a abater-se sobre os nossos hospitais.
Apesar de tudo isto, o ministério da saúde continua a tentar tranquilizar-nos através da repetida constatação do óbvio: “estamos melhor preparados para a segunda vaga do que estávamos para a primeira”.
Numa semana em que reabrem as escolas e nos são dados a conhecer números galopantes de infecção por COVID-19, esta retórica não só é errada, como é também perigosa.
Em suma, somos um povo resiliente, mas também resignado e obediente… Se calhar, o melhor é mesmo continuarmos a dizer: “Sim Sr. Ministro!”
Pedro Amaral escreve segundo a anterior ortografia
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