Artigo de Altino Magalhães
O Natal foi sempre (ainda o é) a festa mais importante do calendário festivo cristão e tradicionalmente comemorado em família.
Desde há muitos e muitos anos, as pessoas deslocam-se de bem longe, procurando viver a noite de 24 para 25 e o próprio dia 25 de dezembro junto dos seus parentes, vindo até casa dos avós e dos pais, onde se juntam, para festejar de forma bastante efusiva a noite da “Consoada” e o dia de Natal. Muitos ficam ainda para o dia 26 para irem à feira das Oitavas!…
Antigamente, na véspera de Natal, uns vinham de comboio, saindo na Estação de “Cahide”, outros de “camioneta” (autocarro), e até a pé quando o percurso era possível fazer-se, para se chegar antes de anoitecer. De automóvel, somente um ou outro, melhor “instalado” na vida!… Não havia casa alguma, nestas Terras de Lousada, que não se comemorasse o nascimento de Jesus.
Uns dias antes, era “armado” o Presépio. Já se compraram algumas prendas na feira e os condimentos alimentares que não existiam em casa já foram adquiridos, para que não faltasse nada, quando chegassem as visitas, naquele dia especial.
Durante o dia 24 de Dezembro, a azáfama era total. As donas de casa faziam os doces e preparavam os alimentos para serem cozinhados à noite. Os homens passavam esse dia no campo a apanhar erva para o gado, ou então a tratar dos animais, pois estes dias que se avizinhavam não se trabalhava e era preciso manter os animais protegidos.
Os filhos, netos e bisnetos, alguns sobrinhos, tios e irmãos iam chegado ao longo do dia…
Logo após o jantar (almoço nos nossos dias) do dia 24, estava na hora de preparar a Ceia de Natal!… As rabanadas, a aletria, as filhoses, os bolinhos de chila (botefa/abóbora), o bacalhau frito com açúcar, os formigos (iguaria de pão cozinhado, mel, vinho, manteiga, ovos e açúcar, recheados de pinhões, nozes e avelãs), a sopa seca… já estavam prontas desde a manhã e o pão de milho já tinha sido cozido em forno de lenha, lá pelas cinco horas da matina!…
Então, nessa tão esperada noite, reunidos à volta da mesa coberta com a melhor e mais bonita toalha de linho, iluminados pelas candeias de azeite ou a petróleo (uma ou outra casa já possuía “petromax”), lá comiam, à farta, as batatas cozidas com bacalhau e ovos cozidos, acompanhadas pelas tronchudas, cenouras e um ou outro legume colhido diretamente da horta da casa. A lareira crepitava de “alegria” com tocos de lenha bem seca. A almotolia neste dia estava cheia de azeite e ao lume, cafeteiras de barro, onde se preparava café para se ir bebendo durante o serão que se avizinhava longo.
Chegava a hora das sobremesas e de degustar os doces que bem “enfeitados” com açúcar, canela e outras especiarias, apareciam na mesa com um aspeto de se ganhar “água na boca”!…
Depois de refastelados de um abundante jantar, os mais velhos recordavam tempos idos, contavam contos e cantavam melodiosas canções de Natal até à hora de irem à Missa do Galo, pela meia-noite, na Igreja matriz da freguesia que também estava ornamentada com bonitos presépios e com um grande Menino Jesus de barro que iria ser dado a beijar, a todos os presentes, no final da Missa.
Os mais novos jogavam ao “rapa, tira, deixa e põe” (jogo tradicional popular que haveremos de fazer referência em rubrica própria), os mais velhos jogavam às cartas, ao “par e pernão” e a outras brincadeiras.
Chegada a hora de ir para a Missa do Galo, que começava à meia-noite em ponto, os mais pequenos iam para a cama e não se esqueciam de deixar um sapatinho junto da chaminé. O Menino Jesus haveria de deixar uma prendinha no sapato, durante a noite!…
As raparigas solteiras levavam para a Missa do Galo, um fruto, normalmente uma maçã, nozes, avelãs e pinhões para dar aos namorados e eles por sua vez, levavam um lenço da mão, bordado com versos (lenço dos namorados), para retribuir à moça o “presente” que lhe havia sido dado naquela noite!…
No dia 25, os mais novos, ansiosos por ver o que tinha o sapatinho, levantavam-se muito cedo e corriam pela casa até à chaminé da lareira da cozinha para verem o que o Menino Jesus lhes tinha trazido como presente. Naquele dia todos os sapatos tinham algo. O Menino Jesus até tinha sido bastante generoso porque se portaram bem ao longo do ano!…
Ao meio-dia, a comida era melhorada e comia-se então, o melhor frango da capoeira, assado no forno de lenha ou então carne de porco que era “guardada” para esse dia. Preparava-se um bom “cozido à portuguesa”. Pessoas havia, em casas mais abastadas, que matavam um cabrito ou um anho da corte e assavam-no no forno, com batatas das mais pequeninas para serem assadas inteiras, acompanhadas com arroz do forno com açafrão. Tudo bem acompanhado pelo vinho tinto “carrascão” colhido na vindima passada e provado pelo S. Martinho numa caneca de porcelana.
No final e antes de comerem os doces que tinham sobrado da noite de Consoada, ainda comiam “canja de galinha”.
De tarde lá vinham as danças e cantares, no adro da igreja, num ou noutro terreiro da casa, se o tempo assim o permitisse. Mas, como era época do frio, dançava-se e cantava-se mais dentro de casa, principalmente nas cozinhas grandes. A Festa durava todo o dia de Natal!…