Fernando Teixeira, emigrante na Argentina: “Eu sou do sítio onde estou”

Nasceu em Arouca em 1945 e dali saiu com 6 anos de idade. Percorreu Portugal de lés a lés e teve diversas profissões, até se estabelecer em Lousada como diretor de produção da Kispo. Tem residência na Argentina, para onde emigrou e se estabeleceu há 17 anos. “Em breve será tempo de regressar, mas não digo regressar à minha terra, pois essa é aquela onde eu vivo no presente. Não sou de Arouca nem de Penafiel, nem de Lousada, nem de Cádiz (Espanha), nem de Mar del Plata (Argentina)”, afirma Fernando Teixeira da Glória, conhecido como “Teixeira da Kispo”.

“Olho para o passado e admito que foi em Penafiel que fui mais feliz, e foi em Lousada onde mais me realizei no trabalho e onde deixei ligações fortes”, admite este emigrante na Argentina, que está em Lousada “a tratar do futuro”.

Os pais mudaram-se de Arouca para Penafiel quando Fernando Teixeira tinha 6 anos de idade. “Senti-me penafidelense de corpo e alma até ir para a tropa. Na rua do Carmo, porta 77, número que por coincidência é o da idade que farei dia 5 de Julho, construí memórias que me acompanham desde a juventude. São sobretudo recordações de pessoas. Tive muitas vivências felizes na zona da igreja Matriz e arredores, desde a escola primária até aos meus primeiros ofícios como aprendiz de alfaiate e ajudante de sapateiro”, revela.

Depois veio a tropa, que frequentou em Aveiro e Lisboa: “Não fui para a tropa só para aprender a dar tiros. Eu queria aprender tudo. Fui sempre um colecionador de conhecimento. Mandaram-me para a Escola Prática de Administração Militar, em Lisboa, na zona do Lumiar, perto do estádio do Sporting e do hospital Pulido Valente. Foi um marco importante para a minha vida profissional pelos conhecimentos e traquejo que me deu. Fui colocado a exercer atividade administrativa num quartel em Lordelo do Ouro, no Porto, onde também fui chefe de bar e fiel de armazém”, relata Fernando Teixeira.

Após cumprir o serviço militar estabeleceu-se no Marco de Canaveses, terra de onde eram naturais os seus pais, passando a trabalhar nos serviços administrativos da empresa da Barragem do Carrapatelo. Foram dois anos naquele emprego, com intervalo de dois meses, devido a uma licença de trabalho ou comissão de serviço, que consistiu em trabalhar nos escritórios do Metro de Lisboa. Com confiança e orgulho dispara: “quando cheguei à empresa do Metro encontrei de pantanas o serviço que me estava destinado e em dois meses organizei o trabalho de meio ano”.

“O setor administrativo, o secretariado, a gestão de pessoal e afins foram áreas que eu dominei muito bem, mas a minha atividade preferida estava afastada desde a juventude. Do que eu gostava mesmo era de confeção e alfaiataria. Por isso, concorri a um anúncio da Supercorte, do grande empresário e excelente ser humano, Martins da Costa. Fiz formação em 1973 e tomei parte na equipa que abriu a Profato, em Paços de Ferreira”, explica Fernando Teixeira.

ENTRADA PARA A KISPO

A sua atividade naquelas empresas de confeções permitiu-lhe cruzar-se com um importante profissional desse setor industrial em Lousada: António Gomes Ribeiro, encarregado comercial da Fabinter (Kispo). “Certo dia, em 1975, batem-me à porta e, para meu espanto, deparo-me com o Ribeiro, que me conhecia do tal estágio na Supercorte. Disse-me que o Hans Isler, o suíço que fundou a Fabinter, em Lousada, precisava de um chefe de produção e lembrou-se de mim, porque eu dominava a parte administrativa e a parte da produção. Custou-me deixar a Profato, porque nunca tinha conhecido um patrão tão generoso e tão preocupado com os empregados como o Martins da Costa. Mas arrisquei e assinei contrato de dois anos com a Fabinter. Acabei por ficar 14 anos seguidos, começando como chefe e terminando como diretor de produção”, salienta o nosso entrevistado.

“Decidi ir embora da Fabinter quando vi um administrador despedir o filho e herdeiro do falecido Hans Isler. Vi logo que aquilo não ia acabar bem. Eu já tinha uma fábrica de confeções a funcionar, em Bitarães (Paredes) e fui à minha vida”, evidencia Fernando Teixeira.

Decorria a década de 1980 e a Fabinter produção têxtil estava em alta. “Durante seis anos a minha fábrica, que era também da minha primeira esposa, trabalhou bem, mas encerrou antes que viessem as dívidas”, explica.

O divórcio, as generosas poupanças acumuladas e a reforma foram os fatores apontados por Fernando Teixeira para dar um novo rumo à sua vida. Segundo as suas palavras, essa mudança passou-se da seguinte forma: “ao longo da vida eu fui uma máquina de poupar dinheiro e quando chegou a reforma fui viver o que não tinha gozado; uma das formas de o fazer foi através de férias em Cádiz, no sul de Espanha, onde eu gostava muito de fazer campismo. Ali conheci Luís Alberto Quijano, um cidadão da gendarmeria da Argentina, de quem fiquei amigo e a quem fui visitar anos mais tarde. Quase sem querer, fiquei cativado pelas maravilhas daquele país. Tudo começou na Terra do Fogo, assim se chama à cidade de Ushuaia , que fica localizada numa colina íngreme, cercada pela cordilheira Martial e pelo Estreito de Beagle. Ela serve como base para cruzeiros e passeios pela Antártida. É um local paradisíaco, onde conheci a minha esposa, Dina Palacios, que é psicóloga”, revela Fernando Teixeira.

“EMBAIXADOR” DE PORTUGAL

“Conheci muita gente e integrei-me depressa em Mar del Plata, uma cidade costeira lindíssima e com muita cultura. Fui secretário do Clube Português de Mar del Plata, que se dedicava a divulgar a cultura e a gastronomia do nosso país. Muita gente ficou encantada com o meu arroz de grelos e com os meus assados no forno, na Feira Anual de Coletividades. Nesse grande evento anual, eu já fiz uma apresentação de meia hora sobre os Descobrimentos  e os Navegadores Portugueses, que foi um sucesso”, afirma categórico.

Os aspetos negativos ou menos bons “também os há, obviamente, e um deles até pode parecer estranho, mas garanto que é muito comum na Argentina: o racismo. Não é fácil para os estrangeiros sobressaírem ou terem ascendente em certos sítios, principalmente sítios menos culturais. Eu digo que o problema do racismo é algo que pode parecer estranho porque na Argentina há uma diversidade muito grande de nacionalidades, mas regra geral estão bem demarcadas por zonas ou regiões”, explica.

O regresso definitivo a Lousada “há-de acontecer, talvez em breve”, revela Fernando Teixeira, um cidadão repleto de histórias e de estórias vividas ao longo de sete décadas, algumas das quais aqui desveladas, mas outras que não cabem numa publicação.

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