por | 4 Jul, 2022 | Louzadense com Alma

FOI “COMPRAR TABACO” E VOLTOU DOIS ANOS DEPOIS

António Victor Araújo, um devoto da Banda Musical

O seu caráter mesurado e discreto fez com que passasse despercebido à maioria da sociedade lousadense. Mas teve um papel de relevo e mérito que importa destacar. Desenvolveu um extraordinário trabalho solidário e voluntário longe das luzes da ribalta, na calada dos bastidores e nas lides administrativas da Banda Musical de Lousada.

António Vítor Nunes de Araújo foi um incondicional servidor da Associação de Cultura Musical de Lousada (ACML). Esta entidade, a quem ele se dedicou afincadamente durante algumas décadas, aproveitou a oportunidade das comemorações do Dia da Música de 2005 para o homenagear. Nessa ocasião, o presidente da ACML, Paulo Afonso da Cunha disse acerca daquele seu amigo e colega de direção: “é mais que um dirigente, é um verdadeiro devoto da Banda Musical de Lousada” e enalteceu-lhe “a competência e humildade, a seriedade e disponibilidade”.

António Victor foi casado com Maria Emília Esteves Alves, da mesma freguesia, e tiveram quatro filhos: Cristina, Maria Albertina, Vítor Manuel e Mário Vítor.

Um marco na sua vida foi a súbita ida para Angola. Corria a década de 1960 e aquela antiga colónia portuguesa estava em clara expansão económica. Um dos lousadenses lá radicados foi Luís Silva, conhecido como “Luisinho da Adega”, amigo de António Vítor, a quem convenceu a experimentar a aventura africana. Não terá sido fácil pois vinha a caminho uma filha, aquela que se viria a chamar Maria Albertina. Mas a proposta era aliciante e ele já tinha vivido uma experiência além-fronteiras, em Macau, aquando do cumprimento do serviço militar. Certo dia, disse à esposa que ia sair para comprar tabaco. Não teve coragem para despoletar a dor da partida. Só voltaria dois anos mais tarde, com um pecúlio monetário por lá angariado na arte que melhor sabia.

Exerceu a profissão de alfaiate ao longo da sua vida profissional, em Angola, em Lousada (na alfaiataria de Manuel Dâmaso), e no seu estabelecimento, em Freamunde. Era um exímio burilador do tecido, concebendo fatiotas e fatos, fraques e outros trajes masculinos com a precisão dos melhores artistas da especialidade. Mas podia ter sido futebolista, se os tempos fossem outros. Na verdade, dizem os seus contemporâneos, era tão hábil na arte de corte e costura como nas técnicas do jogo da bola.

Integrou várias equipas locais como jogador e foi dirigente da Associação Desportiva de Lousada entre 1960 e 1964. O futebol esteve sempre nas suas preferências. Para além de adepto lousadense dizem que era portista, mas parece que nunca o admitiu publicamente, quiçá para não ferir suscetibilidades. Isso condizia com o feito deste Louzadense, prazenteiro e apaziguador.

O futebol foi a primeira de várias participações como associado ativo e como dirigente impecável em coletividades locais. Outro exemplo disso foi a integração em vários elencos de Corpos Sociais dos Bombeiros Voluntários de Lousada.

O filho Mário recorda que “quando eu tinha 9 anos, ia com o meu pai para os bombeiros, pois ele pertencia à Direção e trabalhava em tudo o que fosse preciso. Recordo-me de o ver no bar a servir café e bagaço e a vender bilhetes para o cinema que passava nas noites de sábado e tardes de domingo no salão. As tarefas eram muitas para angariar dinheiro”.

A sublime viagem a Tuttlingen

Também na Associação de Cultura Musical de Lousada (ACML) ficou por demais patenteado o  espírito solidário, desinteressado e empenhado de António Victor , que exerceu diversos cargos diretivos naquela coletividade que albergava a Banda Musical de Lousada.

Foi sempre um aficionado da Banda Musical de Lousada, à qual entregou toda a sua dedicação nomeadamente na sublime deslocação a Tuttlingen e Estugarda, na Alemanha. Desempenhou com mestria e espírito de missão os exigentes cargos de Tesoureiro e de Vice-Presidente, entre outros.

Exemplo da sua postura em vida foi a ida à Alemanha com a Banda. Por não ser músico, achava que não devia ir. Mas a direção convenceu-o. No suplemento do Jornal de Lousada dedicado à triunfal deslocação da Banda Musical à Alemanha em Junho de 1991, pode ler-se na entrevista a António Vítor Araújo: “Eu sou um homem dos papéis, não sou propriamente da música, por isso achava que não deveria ir. Mas fui, e se porventura não tivesse ido, quando me contassem eu iria arrepender-me porque aquilo foi maravilhoso”.

Homem de tradições e de festividades religiosas, António Victor vivia com muita intensidade tudo o que se reportasse à Banda, à Festa Grande e também ao Natal. “Ele adorava essa celebração e, uns meses antes, tratava de pôr de lado dinheiro, para na véspera de Natal, pôr uma nota dentro dum envelope para cada neto e pondo os envelopes no Pinheiro. Por volta da meia-noite as crianças abriam as prendas e claro iam ver os envelopes. Até a abertura das prendas eram passadas a cantar, a tocar flauta, viola e o meu pai tocava ferrinhos. Era uma alegria para ele ter a família toda junta”, recorda com saudade a filha, Cristina Araújo.

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