por | 8 Mai, 2023 | Sociedade

Longe vão os tempos da fuga de homossexuais de Lousada

CÁTIA E FILIPA FALAM DA SUA EXPERIÊNCIA

Vários são os casais do mesmo género que se assumem (uns mais que outros) publicamente como tal. Isso mostra que longe vão os tempos da fuga para longe dos homossexuais de Lousada. Mas o preconceito ainda está muito enraizado. O casal Filipa Pinto e Cátia Neves conta a sua experiência, numa entrevista onde falam dos obstáculos e dos planos para o futuro.

Foi no futebol que se conheceram, quando Filipa, de 32 anos, e Cátia, de 26, jogavam no Lagoas (Lousada) e no Freamunde, respetivamente. “Eu já estava de olho nela. Mas a Filipa estava comprometida com outra (mulher) e eu respeitei isso e mantive-me distante até que a relação dela acabou e nós tivemos a nossa oportunidade”, revela a jovem de Freamunde.

Ambas consideram que “felizmente, as mentalidades estão um pouco mais abertas e em Lousada os casais do mesmo género são mais aceites”, afirma Filipa, que também entende que “ainda há muitos preconceitos, embora não sejam as críticas da sociedade as que mais incomodam”.

“É na família que mais se sofre, porque é onde uma pessoa como nós mais precisa de apoio; com isso uma pessoa enfrenta tudo”, explica Cátia.

No caso de Filipa, a aceitação da sua condição homossexual por parte da família foi mais fácil e explica porquê: “tenho uma personalidade mais vincada e fui mais forte a afirmar a minha escolha, além de ser mais velha e ter tido um relacionamento anterior, tudo ajudou”. Para a Cátia, isso foi mais difícil, pois confessa que é “mais tímida e reservada, menos expressiva e extrovertida que a Filipa e por isso tenho mais dificuldade em lidar com os preconceitos dos outros”.

A homossexualidade revelou-se cedo na vida de ambas, mas “primeiro seguimos o que era suposto para a sociedade e para a família, ou seja, namorar com um rapaz”, diz Filipa, que namorou aos dezanove anos. “Eu não era feliz, não era eu própria. Os meus pais estranhavam porque no namoro eu não era extrovertida; eu fechava-me porque sentia que estava a contrariar a minha felicidade, a minha verdade”. Então decidiu confessar aos pais que sentia atração por mulheres.

Para Cátia a sua própria aceitação do que sentia não foi tão fácil, nem a aceitação da sua família: “na minha cabeça não batia certo gostar de raparigas, mas isso era mais forte que eu, estava na minha essência. Tive uma relação com um rapaz, mas eu não me sentia realizada, não era feliz.”

Casar pela igreja e ter filhos

Admitem que têm zangas e que nem tudo são rosas, mas assumem-se como “muito felizes” uma com a outra e isso transparece nos gestos, nos olhares e na cumplicidade sempre presente ao longo desta entrevista. Começaram a namorar há quase quatro anos e estão juntas há mais de dois. Nesta vida conjunta têm sonhos e planos, mas estão cientes dos obstáculos, que são muitos. “A nossa prioridade neste momento é fazer planos para casar. Eu adorava poder casar pela igreja. Mas não vejo jeitos. Fiz as comunhões, o crisma, enfim, fiz tudo, mas a mentalidade da Igreja não permite casar-nos”, diz com um certo desapontamento Filipa Pinto. E querem ter filhos. “Ambas temos um instinto maternal muito forte”, afirma Cátia.

“Eu já vivi uma tentativa de inseminação e então quero ir com calma em relação a isso. Correu mal porque são setenta por cento de hipóteses de dar negativo e trinta por cento de dar positivo, para um custo financeiro muito grande, é um gasto surreal, sem ajudas do Estado. No caso de as coisas não correr bem é muito dinheiro que se perde num único dia”, desabafa Filipa. Quanto à possibilidade da adoção “é uma hipótese a considerar, mas é um processo que demora imenso”.

São procuradas por casais do mesmo género, “que nos pedem conselhos e connosco sentem-se apoiados. As pessoas homossexuais são muito unidas, em geral. Eu gosto disso e defendo qualquer pessoa que seja atacada ou criticada por causa dessa condição. Há um casal de rapazes que esconde a sua relação e nós ajudamos a sentirem-se integrados. Têm receio da reação dos mais próximos.  Alguns são ameaçados, pela própria família. Se nós temos uma mãe ou um pai ou uma avó que diga «estamos aqui para vos apoiar», o resto fica muito mais fácil de superar”, conclui Filipa Pinto.

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