por | 5 Nov, 2023 | Desporto, Sociedade

O futebol está cada vez mais feminino

HÁ MAIS JOGADORAS E DIRIGENTES

A recente eleição de uma mulher (Alexandrina Cruz) para a presidência de um clube (Rio Ave) da Primeira Liga do futebol português é um exemplo da entrada de cada vez mais mulheres no futebol (e no futsal). Estas modalidades, que até há pouco tempo eram dominadas por homens, têm agora muitas mulheres, como praticantes e dirigentes. Isso também acontece em Lousada. Vejamos o que dizem algumas das lousadenses que fazem parte deste fenómeno que está em crescimento.

Influenciada pelo pai, Eurico Sousa, que foi jogador, treinador e dirigente, Inês Fernandes Sousa, fez parte de uma equipa de futebol feminino da Associação Desportiva de Lousada (ADL) e atualmente é diretora no clube. “Tenho inúmeras memórias que me conectaram ao longo da vida com o futebol. Cresci numa casa com um mini museu da Associação Desportiva de Lousada, onde o meu pai acumulava medalhas, cachecóis de vitoriosos campeonatos, camisolas do clube que são autênticas relíquias”, diz a dirigente.

Inês Sousa

A claque foi no entender de Inês a primeira participação que teve no clube, ainda no antigo estádio no Campo da Feira. Depois, foi atleta e mais tarde dirigente em diferentes períodos.

Na sua opinião, “é crucial o investimento sustentável na formação feminina no sentido de criar raízes nos clubes e alargar a oferta, que é ainda vaga, em comparação com as dimensões e estrutura do futebol masculino”.

Vivemos tempos de significativa evolução no futebol feminino, “no entanto há um árduo trabalho de fixação de atletas nos clubes de pequena dimensão pela atração que os grandes impõem e cria disparidades gigantescas no campeonato feminino”, acrescenta Inês.

Para esta lousadense, “a Federação Portuguesa de Futebol deve focar-se na criação de políticas de equidade para a construção de um campeonato competitivo e equilibrado, com o objetivo de o tornar mais atrativo aos clubes, aos dirigentes e às atletas”.

“Muito espírito de sacrifício” (Cristina Couto, Lagoas)

Chama-se Cristina Couto e é uma referência na formação de jovens futebolistas em Lousada. Olhando para a ascensão da mulher no futebol, diz que é “um bonito trajeto, que se tem conquistado”. E explica que isso se deve à “determinação e competência das mulheres para fazerem parte de um mundo que foi durante muitos anos só conexo ao género masculino. Acho que ainda há algum caminho por percorrer, podemos observar a disparidade do custo de um bilhete num dérbi masculino nacional, e um dérbi nacional feminino…ou uma seleção nacional masculina e uma seleção nacional feminina, que apesar de igual presença num mundial”.

Cristina Couto

Algumas até são mães e “muitas jogadoras têm uma atividade profissional além do futebol, acho que isso representa muito o futebol feminino, pois implica muito espírito de sacrifício, muita determinação, coragem e paixão pela modalidade. Deve-se essencialmente a isso, à determinação e crer de cada uma de nós, sem negar que há um envolvimento maior por parte de todos, cada vez mais entidades desportivas e clubes dão resposta, cada vez mais se vê equipas femininas de formação, desde as mais tenras idades”, afirma a experiente treinadora.

Além disso, Cris Couto enaltece que “cada vez mais há mulheres nos cursos de arbitragem, clubes com mulheres nos seus cargos de direção e treinadoras”.

Durante vários anos foi jogadora, mas Cristina Couto diz que teve sempre um gosto pelo treino e formação: “lembro-me que aos 14 anos já procurava informações sobre cursos de treinadores, sempre foi um objetivo para mim, sobretudo formação de crianças e jovens”. No verão de 2015 a União Desportiva de Lagoas começou a formação no clube, e “num momento em que eu não estava mesmo nada à espera, surgir o convite por parte do presidente Rogério Morais para liderar a equipa de Petizes e Traquinas em estreia absoluta nas competições oficiais e assim começou a minha aventura no futebol federado”, revela.

Marcante foi também o curso de treinadora de Nível 1, que tirou em 2016. “Ao longo destes anos, treinei várias equipas da UD de Lagoas, desde Futebol de 5, Futebol de 7 e mais recentemente Futebol de 11, foram anos muito desafiantes”, explica a treinadora, que na época atual lidera os Juvenis daquele clube.

“Ainda há uma cultura de resistência” (Vera Peixoto, Aparecida)

A aparecidense Vera Peixoto é vice-presidente do clube da sua terra. Desde muito cedo começou a gostar de futebol, “muito por culpa do meu tio Machado que me levava com ele para todos os jogos do Aparecida, em casa e fora, mas também me levava diversas vezes ao saudoso Estádio das Antas”, declara esta dirigente. E acrescenta que cresceu “a ver futebol, a aguardar ansiosamente pelo domingo para ver o Aparecida jogar”.

Vera Peixoto

Mas afirma que “ainda há uma cultura de resistência à participação feminina, já que o futebol foi criado por homens e voltado para o público masculino. No entanto, nos últimos anos, as mulheres têm vindo a quebrar alguns paradigmas e afirmando a sua presença em áreas tidas como masculinas, como é o caso do futebol. Este ganhar de espaço, em vários segmentos da sociedade, parece-me que é o motivo da crescente entrada das mulheres no mundo do futebol, aumentando, consequentemente, o número de atletas, dirigentes, árbitras, jornalistas e até espectadoras”.

Diz com firmeza que “as mulheres trazem ao futebol tanto quanto um homem pode trazer. O meu desejo é que sejam dadas às mulheres as mesmas oportunidades de se colocarem no mundo do futebol. Que as mulheres se sintam bem-vindas no meio e que as pessoas no geral deixem de reproduzir práticas e discursos nas quais cabem aos homens determinadas funções e às mulheres outras”. Vera Peixoto confia que se está a “caminhar para uma época em que o futebol seja um espaço mais igualitário e onde o género não determine quem experimenta a emoção de um jogo”.

Este ano foi convidada para fazer parte da direção do Aparecida, “convite que aceitei de imediato, em primeiro lugar porque gosto imenso de futebol, depois porque me identifiquei por completo com o projeto audacioso que o presidente tem para o Aparecida Futebol Clube, e por último porque, ele entendeu que eu poderia ser uma mais-valia”, afirma a dirigente.

Sobre a possibilidade de chegar a presidente, diz apenas que pretende “estar presente, ajudar naquilo que estiver ao meu alcance e fazer parte desta equipa fantástica, com um espírito de trabalho, esforço, dedicação e entrega”. A terminar diz esperar que “esta minha posição na direção abra espaço para que as mulheres se sintam representadas e que abra, cada vez mais espaço para o interesse da audiência feminina”.

“É um processo natural da sociedade” (Raquel Costa, Lustosa)

Na presidência da Associação Desportiva de Lustosa está Raquel Costa. Além do futebol distrital e do atletismo, a coletividade lustosense envolve muitas dezenas de atletas. O desafio de dirigir o Lustosa como presidente “é apenas um cargo, é assim que eu vejo isto, pois o importante é o trabalho de toda a direção, equipas técnicas e atletas, como um todo”, afirma.

Raquel Costa

Não se mostra surpreendida com a ascensão da mulher nesta área e diz que “é um processo natural da sociedade, não só no futebol” e que “já não há a crença de que futebol é um desporto só para homens” e justifica isso “com o crescimento do futebol feminino e dos escalões mistos, daí que é natural a aparição de mais mulheres tanto a jogar, como na parte diretiva”.
“Em todos os ramos as mulheres têm conquistado lugares de destaque e o desporto não é exceção. Não sei se as mulheres podem acrescentar algo de diferente, acho que todos podemos acrescentar mais um bocadinho, se nos dedicarmos e trabalharmos em conjunto, principalmente para o crescimento do associativismo. Acho que a diferença não está em ser homem ou mulher, está em gostar e dedicar-se”, indica Raquel Costa.

“Cada vez mais um palco de sonhos” (Ana Silva, Romariz)

O F. C. de Romariz é um expoente no futebol feminino local, onde Ana Rita Silva é treinadora estagiária (está a tirar o curso) e faz parte do departamento de relações públicas, além de fazer formação para jovens atletas. Pensa que “o aumento das Mulheres no futebol deve-se à grande vontade da mulher se querer afirmar e atualmente vemos cada vez mais mulheres a arbitrar jogos, temos treinadoras, diretoras, massagistas, que tornaram realidade o sonho de mulheres que há 10 ou 20 ou 30 anos não puderam concretizar”.

Ana Silva

Ana Silva mostra-se contente por “existirem 13 mil atletas no futebol federado, por a nossa seleção ter sido pela primeira vez apurada para um Mundial”, mas sublinha que “há tanto ainda que se pode mudar, como os apoios e investimentos para que as atletas tenham as mesmas condições que no masculino, a visibilidade através dos media, etc”.

Também se diz agradada com a existência de uma primeira divisão quase profissional, mas alerta que “temos atletas que estudam e trabalham, que todos os dias se levantam cedo, saem de trabalhar e às 20 horas começam o treino e só chegam a casa às 23 horas, e no dia a seguir voltam a levantar-se e a fazerem a vida delas”.

Contudo “a resiliência das mulheres irá continuar a fazer com que o futebol feminino seja cada vez mais um palco de sonhos que se realizem e a sociedade vai acabar por mudar a sua mentalidade, triste é dizer que apenas vai mudar consoante as conquistas que tivermos e só aí é que irá perceber que afinal o futebol feminino é uma boa aposta”, afirma Ana Silva.

@ unsplash / Your Lifestyle Business

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