António Mesquita: Primeiro a sua terra, depois a política

Investiu na sua formação académica e tornou-se uma referência na mediação de seguros. Passou também pela vida política, tendo sido eleito vereador pelo PS durante dois mandatos, mas assume que no trabalho que realizou de cidadania sempre se posicionou acima das questões político-partidárias, o que facilitou o trabalho com a oposição. Falamos de António Teixeira Mesquita, que nasceu em 1954 no Torno, mas prefere dizer-se natural da vila da Aparecida.

Com dois irmãos mais novos, diz-se nascido no seio de uma família “pobre, mas bonita”, que vivia as alegrias do convívio da aldeia, bem diferente da realidade atual: “O largo da feira era a rua, nós vínhamos à rua jogar à bola e conviver com amigos”, conta. Naquele tempo, a Aparecida vivia um certo cosmopolitismo, atraindo população das redondezas. “Era uma terra de comércio, com muita atividade. O meu pai era armazenista”, refere.

Romaria da Senhora Aparecida marcou a sua infância

A festa era, sem dúvida, o ponto alto da vida religiosa e social. Para António Mesquita, era uma festa diferente de todas as outras. Desde pequeno que guarda as imagens da romaria, que perdura no tempo. Os romeiros, com os seus merendeiros, a feira do gado no largo, as práticas religiosas… “Tudo é diferenciador na festa da Aparecida”, defende. Mas o destaque vai para a majestosa procissão, com os seus andores colossais e imponentes: “O andor grande já era grande na época. Enquanto qualquer procissão tinha um andor ou dois no máximo, em Aparecida eram mais de seis”, lembra. As obras realizadas nos últimos anos, na ermida e no santuário, também são motivo de orgulho para António Mesquita: “A obra notável do ainda atual padre José é uma marca que ficará para sempre, transformando aquele pequeno santuário numa referência, elogiada pelo bispo do Porto”, refere.
A festa centenária da Senhora Aparecida acontece todos os anos nos dias 13, 14 e 15 de agosto e envolve os aparecidenses: “Só possível com o labor e a dedicação das pessoas da Aparecida, e na maioria dos casos os mais humildes”, sustenta.

Escola era dura, mas permitiu-lhe voar mais alto

Mas da infância não ficaram apenas as memórias da romaria da Senhora Aparecida. A escola foi outra das experiências marcantes. A mãe, Maria Teixeira, não sabe ler nem escrever, mas manifestou sempre grande preocupação com a formação académica e religiosa do filho. Completou a quarta classe e o exame de admissão com o rigor daqueles tempos e ingressou no ensino preparatório. A nível religioso, fez a Profissão de Fé.
O ensino da altura era muito diferente do atual. António Mesquita fala de uma aprendizagem “sofrida e dorida”, que não lhe tirou a vontade de vencer as dificuldades e progredir. A “grande” professora Ester contribuiu para essa progressão.

Ainda com tenra idade, apenas 7 anos, o pequeno António sofreu a primeira perda dolorosa, com a morte do pai. “A mãe passa a ser o esteio, de entrega total ao filho mais velho, a um mais novo e a uma menina que tinha nascido a apenas um ano”, conta. Para sustentar a família, contava com o seu trabalho de bordadeira e algumas rendas. Assim conseguiu educar os filhos. “Um exemplo de abnegação e trabalho”, diz, sempre a pensar no futuro dos filhos: “A minha mãe queria que eu fosse algo mais tarde”.

Numa altura em que as crianças começavam a trabalhar aos 10 anos, da sua turma, só ele prosseguiu os estudos na Escola Industrial de Penafiel. Terminado o antigo ciclo, foi para o Porto, onde frequentou a Escola Comercial Oliveira Martins. Já a trabalhar, não abandonou a vida académica, continuando os estudos no colégio Escola Académica do Porto.

O “empurrão” do tio Arnaldo Mesquita

▲António Mesquita na Mutual Companhia de Seguros

Em agosto de 1969, o tio Arnaldo Mesquita deu-lhe o “empurrão” que o levou ao mercado de trabalho. O tio deu-lhe um cartão de visita, para entregar ao senhor Maximiano Silva, o administrador da Mutual Companhia de Seguros. “O portador deste cartão é meu sobrinho órfão de pai, se o puder ajudar.” Assim escreveu no cartão. “O homem recebe-me às 16h30, às 17h já me tinham apresentado o local de trabalho. Disseram-me: amanhã começa a trabalhar”, conta.

Numa altura de guerra colonial, António Mesquita não cumpriu o serviço militar. Isto porque, no ano em que poderia ser mobilizado, deu-se o 25 de Abril. “Exibi na altura uma flexão no dedo, que fez com que ficasse apurado só para serviços auxiliares, mas, como mais tarde os contingentes terminaram, fui dispensado da tropa”, explica.

Estando já no mundo do trabalho, foi descrevendo uma curva ascendente. Começou como paquete e acabou a carreira como gestor do balcão de Penafiel da AXA Portugal, agora AGEAS.

Foi um homem feliz a fazer aquilo de que gosta. “É uma atividade fantástica. A possibilidade que temos de poder oferecer aos outros (para aquisição) os produtos que as pessoas tanto necessitam para proteger os seus bens patrimoniais e imateriais (vida e a saúde). Ter este potencial para a venda é algo que nos encoraja, que nos faz crescer”, considera.
Ao longo da sua carreira, ciente da importância da comunicação, procurou ser o mais assertivo possível. Especializou-se de tal forma na sua área que admite não saber desempenhar outra profissão. “Não sei fazer mais nada. São já cinquenta anos de atividade, com muitas vivências. Hoje, na qualidade de proprietário de dois espaços (lojas) em Lousada e Penafiel, represento a marca AGEAS na qualidade de Agente Geral Exclusivo um projeto de agente geral exclusivo. Pertenço a um número restrito de agentes com essa qualificação”, refere.

António Mesquita

Vida entre o meio rural e citadino

A vida de António Mesquita alternou entre o campo e a cidade. Conheceu de perto as duas realidades. Manteve os amigos da aldeia e foi fazendo novas amizades na cidade. Foram, portanto, uma infância e juventude marcadas pela diversidade: “Além de conhecer o meio rural, conhecia o meio citadino, o cinema, o teatro, o desporto…” Já na Mutual Companhia de Seguros, iniciou-se na prática do futsal e futebol de onze e no atletismo. Mais tarde, passou a jogar no clube da sua terra, Aparecida. “Com a marca do meu grande amigo Joaquim Rafael. Era uma pessoa notável (como empresário e especialmente como amigo), particularmente nos veteranos do Aparecida. Fomos capazes, enquanto equipa, de percorrer o país de Chaves a Monchique, no Algarve. Até lá fora fomos, a Tulle – França”, recorda.
O gosto pelo futebol parece ter sido uma herança familiar, já que o seu pai António Lopes de Oliveira Mesquita foi um dos fundadores do Aparecida Futebol Clube em 1931, o sócio numero 3 e o seu tio, Júlio de Oliveira Mesquita conjuntamente com o Sr. António Fernandes “Massas” em 1972 inscrevem o Clube na Associação de Futebol do Porto. “O Aparecida FC é também uma referência na terra com um forte e marcante passado, vai participar na divisão de Elite da AFP” disse.

▲Equipa de Veteranos do Aparecida FC – Anos 80

Preso pela PIDE por participar em manifestação

Adepto dos ideais de liberdade apoia as lutas estudantis citadinas antifascistas, com apenas 19 anos, conheceu a dureza do designado Estado Novo, quando, a 15 de abril de 1973, participou numa manifestação na Praça da Liberdade, onde foi espancado. Ferido, foi detido e levado para o Hospital de Santo António, de onde saiu pela porta dos fundos, ajudado pela tia, esposa de Arnaldo Mesquita, que trabalhava no laboratório de análises daquele hospital. Decorridos alguns dias a PIDE bate-lhe às portas (onde vivia no Porto – em casa do tio Arnaldo e em Aparecida (casa da mãe) , foi preso: “Estive preso até ao dia 2 de maio nos calabouços, na Rua do Heroísmo. Todos os dias tinha interrogatório, sobre as causas da minha atuação e a eventual ligação ao Partido Comunista. Fiquei em isolamento, a maioria dos outros, detidos pelas mesma razão estavam em grupo. Estava assim porque fazia militância, mas não estava inscrito em partido nenhum. A manifestação foi convocada através de massiva proliferação de panfletos espalhados pelos bairros da cidade durante a noite e eu ajudei nesse trabalho”, esclarece. A viver em casa de Arnaldo Mesquita, uma referência no Partido Comunista, é natural que esse facto tenha pesado ainda mais na sua detenção.

Entra na política local a vencer

A vitória do PS em Lousada trouxe António Mesquita para a ribalta da política local. Foi convidado por Jorge Magalhães para integrar a equipa à Câmara. Independente, disse que sim, preferindo os últimos lugares da lista. Mas Jorge Magalhães reservou-lhe o quarto lugar. Após a saída do executivo de Carlos Pacheco, que ocupara o terceiro lugar, António Mesquita assumiu o pelouro do ambiente e proteção civil.

Aquando do convite para integrar a equipa socialista, o ex-vereador acreditava já na vitória, tendo em conta a força da juventude da equipa. “Quem apostava fortemente na vitória era o Jaime Moura e o PSD. Nós éramos os outsiders. O PS surpreende por uma razão simples: em sete vereadores elege três, uma maioria relativa”, conta.

António Mesquita foi vereador numa altura difícil, em que se começava a trabalhar no projeto de distribuição de água ao domicílio. O assunto era de tal importância que existia até o vereador das águas. “O mais importante era perceber a origem da captação. Tínhamos de elaborar projetos regionais, sobretudo pela necessidade de ter uma origem de água duradoura. A água, na altura, escasseava muitas vezes nas torneiras dos lousadenses. A única captação com água em condições era da serra de Campelos e um furo no bairro Dr. Abílio Alves Moreira”, refere. Tempos muito diferentes, em que escasseavam os recursos. “Estamos a falar de um tempo onde a recolha do lixo era feita apenas com um carro. Só havia um carro de lixo”, sublinha.

▲Festa promovida pelo Aparecida FC – António Mesquita enquanto vereador do
CM de Lousada entregando uma lembrança a Amália Rodrigues

Nessa altura, foram também lançados os primeiros projetos estruturais da proteção civil municipal e da proteção da floresta. O ex-autarca relembra uma obra que se tornou importante para o desporto automóvel: o caminho florestal aberto entre a Ordem e a Serra de Campelos, transformou-se e preparou-se para acolher o Ralli de Portugal ficando conhecida como a classificativa Lousada/Serra de Campelos. “Um caminho florestal tornou-se uma excelente classificativa do Rally de Portugal, uma inscrição minha”, diz, com orgulho.

Os primeiros passos para o aterro foram dados durante os seus mandatos. “Eu diria que Lousada acaba por beneficiar da visão e da ação do exercício autárquico, do meu tempo, mas é com Jorge Magalhães e mais tarde com Pedro Machado a quem confere um papel insubstituível. Tenho de lhes fazer a vénia, pois na minha opinião (ao longa das últimas décadas) têm feito um trabalho notável”, considera.

Falta de recursos era a maior dificuldade

O ex-vereador exerceu funções durante dois mandatos e cruzou-se com muitas figuras importantes. “No primeiro mandato, tenho de destacar uma pessoa que para mim é (foi) especial, o professor Luís Pinto da Silva, que sempre soube fazer as melhores pontes para que conseguíssemos seguir em frente. Eu até quis partilhar o meu gabinete de trabalho com ele. Era uma em pessoa em quem eu confiava mesmo”, diz. De sublinhar que o professor era social-democrata. Para António Mesquita o trabalho de cidadania estava acima da política partidária. Também destaca os nomes de Jaime Moura e Francisco Barbosa.

A maior dificuldade que encontrou ao longo dos mandatos foi a escassez de recursos, quer humanos, quer financeiros, pois “tudo tinha de ser contado”. Tratou-se, no entanto, de um período rico em experiências.

Depois do período como autarca, em que era indispensável estar sempre disponível para as pessoas, mesmo ao fim de semana. Em 1998, regressou à sua antiga atividade profissional, à AXA, em Penafiel. “A vida de um autarca é muito redutora. A ausência dita muita coisa e eu achei que a representação da autarquia tinha de se fazer não só durante a semana, mas também aos fins de semana. Nós tínhamos de ir ter com as pessoas, pois as pessoas gostam de nos ver e sentir a proximidade”. É assim que justifica o regresso à sua profissão, que entendeu ser o melhor para si e para a sua família.

A família, nesta altura, já incluía dois filhos e a esposa, Laura Maria, professora, natural de Meinedo, “de uma família de origens muito bem referenciadas”. António Mesquita conta como a conheceu: “Passei com o meu primo pelo salão paroquial de Meinedo. Isto porque o pai fazia aí serviço de voluntariado. Paramos o carro e tomei um café, mas disse para o meu primo: “Vou namorar com esta menina que estava ali ao balcão”.
Precisou de um casal amigo e um Fiat 127. “Fizemos uma viagem de carro a Viseu e foi aí selamos a relação, que tem mais de quarenta anos. Presumo que só a morte nos vai separar”, diz. Após quatro anos de namoro, casou. Tinha 24 anos. Após algumas obras de remodelação na casa da família, fixou-se na sua terra natal, a Aparecida.

A dor da perda do filho

Mas a vida não foi complacente com António Mesquita. Em 2000, surge a doença do filho, um sarcoma, fê-lo passar pela maior provação. “Ao fim de dois anos de combate (quimioterapia, radioterapia, perda de cabelo… e muito sofrimento, vence o cancro, palavras do médico assistente. O médico diz-nos que ele tinha vencido, mas, passados seis anos, em plena atividade desportiva, voltou a reaparecer. Jogou nas camadas jovens do Aparecida FC de onde sai ainda Júnior para o Lousada, como júnior é chamado muitas vezes a integrar a equipa sénior. Interrompe pela grave doença. Regressa depois e ingressa no Baião, depois no Aparecida no Vila Meã , onde atinge o máximo da sua carreira (subida de divisão ao escalão nacional e participação até aos oitavos de final da taça de Portugal onde, no Funchal, são vencidos pelo Marítimo. Era (foi) um grande lutador – o meu herói”, conta. . “Perder um filho é uma dor muito forte, a maior de todas as dores”, desabafa. A força para continuar vai buscá-la à homenagem que lhe presta. Tem-no sempre presente na sua vida: “O início desta atividade de mediação é com ele que se faz. A empresa chama-se André e Diana” o nome dos meus filhos, diz.

A neta Carolina, ou Nini, como é carinhosamente tratada, é a alegria dos avós e ajudou-os a superar a perda do filho: “É a vivência que nos enche permanentemente o coração e a mente. É uma criança que temos e adoramos, temo-la quase todos os dias em casa, é a companhia que nos faz superar o falecimento do nosso filho”.

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