O território que hoje forma a Vila foi pertença de quintas e respetivas casas senhoriais. Até o Monte das Pedrinhas (atual Jardim do Senhor dos Aflitos) pertenceu a grandes propriedades. As quintas do Carvalho, Barreiro, Ribeiro, Vila Meã, Pocinhas, Loreto, Lagoa e Tojeiro, compunham o que se chamava Tarrão. Foram esses proprietários os promotores do pedido para a Rainha D. Maria II atribuir àquela localidade a designação de Vila de Lousada, em 1842. Do desaparecimento de várias dessas grande propriedades agrícolas e florestais, por força do urbanismo, fala-nos José Ferreira Junior, de 95 anos, antigo feitor da Quinta de Vila Meã, o último bastião rural às portas de uma Vila cada vez mais expansionista e citadina.
José Ferreira Júnior passou quase toda a vida ativa a cuidar de quintas. Mesmo depois de aposentado cultivou com mestria os seus terrenos e de outros. Trabalhou sobretudo na quinta de Vila Meã (Silvares), cuja história no século XX conhece de fio a pavio. Aliás, lembra-se de todas as outras quintas que compunham a Vila de Lousada e seus arredores e que hoje já desapareceram ou estão em vias de desaparecer. “Os tempos modernos são assim, cheios de força contra a Natureza, fazem desaparecer os campos e montes e no seu lugar erguem-se prédios e estradas, vai quase tudo a eito”, observa este cidadão natural do lugar de Cegonheira (Silvares), na Quinta de Vila Meã. Realça que viveu duas realidades opostas, a ruralidade às portas e no interior da vila e o expansionismo urbano. Sobre isso exclama: “a vila de hoje é uma diferença dos diabos”.
“Eu ainda sou do tempo da feira de Lousada fazer-se na Praça da República e ainda sou do tempo do caminho-de-ferro que ligava Penafiel à Lixa e passava pelo centro de Lousada; não sou do tempo do comboio, mas sou do tempo dos carris e de ver o seu levantamento e as vigas levadas para servir de esteios e bancas de ramadas, na quinta de Vila Meã”, revive este nosso interlocutor.
Com o comboio em tema de fundo na conversa surgem relatos contados pela mãe de José Ferreira Júnior: “nos tempos dela, contava-se piadas sobre a falta de força do comboio a vir da Lixa para Lousada. Ao subir do lugar de Ponterrinhas para a Vila, as pessoas tinham que apear-se e ir a pé. Numa ocasião, um vagão desprendeu-se perto do Hospital e só foi parar a Nogueira”.
“O meu pai foi regente e rendeiro de Vila Meã e eu fui feitor. Por causa disso, conheci as quintas da zona da Vila e arredores, principalmente a primeira que vi desaparecer, a Quinta das Pocinhas”, revela José Ferreira Júnior.
A residir em Nogueira desde os seus 60 anos de idade, este ancião também se refere ao desaparecimento da Quinta da Lagoa, “que foi dos Lousadas” e da Quinta do Loreto, “que vai resistindo, em parte, mas que foi sendo espartilhada ao longo da história desde os tempos do rico empresário do Porto, José Aires Pereira”, não esquece a “Quinta do Tojeiro, da qual já nada resta, mas que foi em tempos uma propriedade agrícola muito rica, apesar do nome não dar isso a entender”.
“VAI TUDO A EITO”
Abre-se aqui um parêntesis para citar o recentemente falecido Francisco Vítor da Cunha Magalhães, antigo diretor do Jornal de Lousada, que na edição de 1 de Abril de 1981, escreveu um artigo de opinião versando a Quinta das Pocinhas e que vale a pena recuperar: “(…) Eras tão bela, mas a tua situação geográfica, mesmo no centro da Vila, condenou-te (…). Venderam-te aos talhões, depois desfizeram a venda (…). Instalaram nas tuas encostas umas barracas (salas de aula) que já se começam a desfazer. Mas a época das barracas para ti ainda não acabou. Vais levar com a da Caixa (Geral de Depósitos). E não sei se um dia não te virás a chamar Quinta das Barracas”.
Voltando à atualidade: onde se situava a Quinta das Pocinhas está agora um centro urbano em grande expansão, aglutinando já parte da Quinta do Ribeiro, que se localiza paredes-meias com a Quinta de Vila Meã. E esta também já não é virgem, pois foi-lhe amputada uma tira de terreno para alargamento da rua do Picoto e da rua dos Combatentes.
Questionado se a sua expressão “vai tudo a eito” se aplica também à quinta de Vila Meã, José Ferreira Júnior escuda-se na falta de adivinhação: “o futuro o dirá”. O que lhe parece certo, mas que nunca imaginou, é o desaparecimento da Quinta do Carvalho: “onde havia uma grande e bonita propriedade, da saudosa Laurinha do Carvalho, continua a haver uma grande zona verde (parque urbano), mas também muitos prédios à sua volta”. É uma quinta histórica de Lousada, que já pertenceu a padres, presidentes de Câmara e outras edilidades.
Um pouco mais a Norte dali, a Quinta do Barreiro, pressionada pela procura imobiliária, resistirá até quando? Parece certo que o hipermercado Mercadona vai-se localizar em terrenos que em tempos pertenceu a esta propriedade. Fala-se também no McDonalds.
A madame da Quinta de Vila Meã
Uma professora francesa chegou a ser proprietária da Quinta de Vila Meã, no século XX. Chamava-se Josephine Eugénie Cezarine Jubin, mas era conhecida por Madame de Vila Meã ou Madame Josephine Veloso Araújo, por ter assumido por matrimónio os sobrenomes do marido, Eurico Veloso de Araújo, dono daquela grande propriedade agrícola e florestal de Lousada, com casa senhorial e respetiva capela, datada do século XVIII. Aquele lousadense faleceu novo, a 17 de Dezembro de 1934, no Porto, onde residia com a esposa Josephine, de onde vinha visitar a quinta de longe a longe, especialmente no Verão. Tiveram uma filha, Cecília Yvonne Veloso de Araújo.
Depois de enviuvar, a Madame de Vila Meã passou a frequentar mais a quinta, estabelecendo-se ali durante longas temporadas. A religiosidade levou-a a ativar o culto dominical na capela.
Josephine Veloso de Araújo era bem relacionada nas altas esferas sociais e políticas, conforme notícia do Jornal de Lousada de 8 de Agosto de 1942, que dava conta da ter sido “visitada pelo Sr. Dr. João Pinto da Costa Leite Lumbrales, Ministro das Finanças, e sua Ex.ma esposa”.
Faleceu em Julho de 1953, em dia que não conseguimos precisar. Entretanto a filha há muito que já tinha casado, com Diogo José Cabral Júnior (filho de Diogo José Cabral, 1º Conde de Vizela e de Raquel Reis), de cujo casamento nasceu, a 15 de janeiro de 1934, Mário Manuel Veloso de Araújo Cabral, também conhecido como Nicha Cabral, que foi o primeiro piloto português de Formula 1.
A Quinta de Vila Meã deixou de pertencer ao ramo Veloso de Araújo quando Cecília a vendeu a um empresário de vinhos, José de Sá Dias, que por sua vez a vendeu ao empresário de calçado Valdemar Pinto, casado com Graça de Vasconcelos, pais de Dora Elvira Vasconcelos Pinto, atual proprietária.
Excelente forma de divulgar as raizes de nuestra Vila de Lousada ….para muitos desconocida!….
Un fuerte abrazo
Meireles