por | 15 Jul, 2023 | Grandes Louzadenses

José Diogo Fernandes: “Feliz por ter nascido em Lousada”

Ensinar Biologia encanta-me

O sino da torre do Senhor dos Aflitos ressoa em serenas badaladas na fagueira manhã de julho. Diogo Fernandes, percorre o adro e contempla a Vila, envolvida em indícios de oiro de alba plena, ainda mais risonha, mais alegre, mais apelativa, ansiosa pela chegada da Festa Grande. Vem-lhe à memória um dos trechos mais belos sobre Lousada, escrito em 1940 por Álvaro Rebelo de Carvalho, senhor da Casa das Pereiras (Alentém) e presidente da Câmara Municipal: “Há qualquer coisa de superiormente inefável neste ar leve que aqui se respira, nesta boa gente que ao passar nos saúda, naqueles horizontes azulados que se afastam sem fim.”

Contemplando o casario, as suas memórias abrem-se em círculo perfeito. Da antiga escola primária, agora Biblioteca Municipal, quartel dos Bombeiros e Assembleia Louzadense até à Câmara Municipal e Santa Casa da Misericórdia; da Escola Secundária, passando pelo antigo campo da Associação Desportiva de Lousada até à sede da Associação de Cultura Musical; da sede do Partido Social Democrata (PSD), passando pelo jornal O Louzadense até à LADEC desenha-se um anel que o abraça e vincula, num contrato de amor recíproco entre ele e a sua circunstância.

Ter aqui nascido foi um acaso improvável do encontro de seu pai, o mítico Prof. Adriano Fernandes, natural de Fafe, e de sua mãe, D. Maria Antónia Gonçalves Peixoto, natural de Felgueiras, herdeira da casa e capela da Rua de Santo António, outrora da família Pinto Bandeira, que geraram o filho único, nascido a 5 de agosto de 1965.  

Cinco anos depois, ingressava na escola primária, sob a tutelar orientação de seu pai, que, em permanente escrúpulo de justiça e exigência, nunca lhe concedeu qualquer margem de facilidade. Inclusivamente, era o único da turma a usar bata, símbolo de trabalho e disciplina. Ali conheceu um dos grandes amigos, José António Teixeira – atual presidente do School Dance, professor na Escola Secundária e igualmente muito envolvido na vida pública local –, numa cumplicidade prolongada até à sua própria casa, para a disputa de intensas partidas de pingue-pongue. Após o ensino preparatório, prosseguiu estudos em Paredes – no Palacete da Granja, até ao 9.º ano, em Baltar, no 10.º e 11.º ano – e Penafiel, no 12º ano, construindo a amizade com outra importante figura da sociedade lousadense: António Eduardo Baltar Malheiro de Magalhães, o popular Tozinho, agora lente em Coimbra, com quem se exercitou em jogos de xadrez. 

Apesar de Medicina ser a sua vocação inicial, acabou por ingressar em Biologia na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, num ambiente mais alargado e cosmopolita, que muito lhe alargou perspetivas e horizontes. Ali conheceu Paulo Morais, destacado militante das questões de cidadania e de combate à corrupção, Leonor Gusmão, das mais citadas autoras na área da genética e da investigação, e o professor António Amorim, consagrado especialista da genética forense.

Optando pela via de ensino, no ano letivo de 1988/89 iniciou o percurso docente em escolas do Porto (Escola Secundária Soares dos Reis e Escola Secundária Rainha Santa Isabel), ao mesmo tempo que sobressaía no congresso da Associação Portuguesa de Biologia com uma intervenção que o conduziu à coinstalação da delegação distrital do Porto, inaugurando, assim, a participação associativa que, em Lousada, ganhou especial saliência. E Lousada, sempre dentro dele em chama acesa e atrativa, mesmo nas viagens inter-rail à descoberta da Europa, acolhe-o como professor em 1990 e, logo depois, como membro do Conselho Diretivo da Escola Secundária, presidido por Alvarim da Fonseca Figueiredo, desenvolvendo importante estruturação dos cursos noturnos que possibilitaram o regresso ao ensino de muitos jovens adultos. Na escola, vem a desempenhar os mais variados cargos – diretor de turma, membro do Conselho Pedagógico, presidente do Conselho Geral –, experimentar inovações pedagógicas – em sala de aula e como formador de professores –, garantir a participação nas Olimpíadas do Ambiente e da Biologia – com vários alunos a alcançarem prémios a nível nacional – e a promover visitas de estudo numa época em que a falta de vivências de muitos estudantes ainda era notória, ao ponto de, em 1990, alguns deles nunca terem visto o mar…

Simultaneamente, iniciava presença assídua em múltiplos territórios da vida concelhia. Se, convidado pelo grande amigo, Pedro Matias, integra a comissão política concelhia da Juventude Social Democrata, e, posteriormente, a comissão política do Partido Social Democrata e o conselho distrital, de 1994 a 1997 entra no executivo camarário, liderado pelo socialista Jorge Magalhães, que lhe atribui os pelouros da Saúde e Ecologia, facto irrepetível de distribuição de competências autárquicas a vereadores da oposição em contexto de maioria absoluta. Construção das piscinas e do Auditório Municipal, parque industrial da ex-Estofex, jardins de infância e EB 2,3 de Lustosa e Nevogilde, redes de água e de saneamento, IC25 (atual A 42) e variante à EN 106 foram avanços estratégicos de que, reconhecendo embora sem a sua intervenção direta, muito se orgulha por incorporar e acompanhar de perto “o mandato mais transformador da Câmara de Lousada”.

Quando sai, em 1997, aguarda-o novo desafio: a vice-presidência da Associação de Cultura Musical, encabeçada por Paulo Cunha, ficando responsável pela academia de música (atual conservatório), num mandato “exigente, mas muito aliciante” para a definição de um modelo formativo consistente. A liderar a assembleia geral estava Lúcia Lousada, também provedora da Misericórdia, que o convida a integrar a mesa diretiva da Santa Casa na chegada do ano 2000 – e na qual ainda se mantém. Fica responsável pelo jardim de infância da Casa do Ribeiro, em Sousela, com novas instalações em 2007, mas intervém ativamente no crescimento de muitas outras respostas sociais: estruturação do funcionamento do hospital, restruturação do Lar Sousa Freire, construção do Lar Lúcia Lousada, políticas de combate à pobreza. Uma dimensão solidária, inspirada na sua formação católica, que, inspirado pelo então pe. Camilo Bessa, já o levara a participar nos grupos de jovens e de leitores da paróquia de Silvares, que o conduzirá, também, à mesa da assembleia geral dos Bombeiros Voluntários, em 2008, num período de grande vitalidade da Associação Humanitária. Assumirá, ainda, a presidência da assembleia geral da Associação Desportiva de Lousada, a convite do eterno Mário Fonseca, que desde há 20 anos exercia o cargo e que passava para a liderança da direção, e, em 2010, da LADEC – Lousada Associação de Eventos Culturais, comandada por Joaquim Gonçalves.

O mais recente projeto foi o jornal O Louzadense, de que foi diretor entre 2019 e 2023, integrado na dinâmica da cooperativa InovLousada, a que ainda preside, assegurando sucessivas iniciativas, nomeadamente exposições artísticas e lançamentos de livros e de marca de vinhos,

Numa trajetória permanente de participação cívica, Diogo Fernandes anseia que Lousada continue a ser vila com a familiaridade de sempre e a ambição de se manter como referência no Vale do Sousa como sítio exemplar para viver.

Ao caminhar no frondoso jardim do Senhor dos Aflitos, é novamente rodeado pelo velho avisador da torre, badalando a tarde límpida e lavada, numa convocatória às sonoridades da alma, trazendo-lhe a imagem de três amigos que simbolizam a autenticidade lousadense: Mário Fonseca, Jorge Magalhães e Luís Ângelo Fernandes, companheiros do mesmo ideal que fazem de Lousada o património de todos os sonhos.

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